Título: PC insufla nacionalismo profundo, mas o tiro pode sair pela culatra
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Fonte: O Estado de São Paulo, 16/04/2005, Internacional, p. A15

PEQUIM - Enfurecido com os livros didáticos tendenciosos do Japão e com a disputas territoriais no Mar do Leste da China, o universitário Sun Wei juntou-se a milhares de chineses numa rara marcha de protesto legal realizada nas ruas de Pequim na semana passada. Mas as autoridades da segurança disseram mais tarde que os manifestantes já haviam mostrado sua raiva o suficiente, enfiaram-nos em ônibus e os conduziram de volta ao câmpus universitário.

"Foi em parte um protesto verdadeiro e em parte um espetáculo político", disse Sun numa entrevista esta semana. "Senti-me como uma marionete."

Analistas dizem que a China bateu na tecla do nacionalismo profundo de seu povo apostando que isso possa levar o país a um papel de liderança na Ásia. Ao mesmo tempo, Pequim encobre seu avanço para o poder sob o disfarce de orgulho ferido e vontade popular.

Mas o governo parece também ter tomado medidas para controlar, alguns dizem manipular, o nascente movimento de protesto para impedir um desafio de raiz popular ao Partido Comunista.

Nas últimas semanas, as relações entre as duas principais potências da Ásia atingiram sua mais grave crise desde que os laços diplomáticos foram restabelecidos em 1972. A China confrontou o Japão sobre um livro de história que reduz a importância dos abusos cometidos pelo Japão em tempos de guerra. E intensificou sua reivindicação sobre as ilhas e reservas de gás marítimas disputadas pelos dois países.

Após semanas de insinuações, na quarta-feira os líderes chineses disseram sem rodeios que o Japão não tem qualificações morais para se tornar membro permanente do Conselho de Segurança da ONU.

Essas atitudes têm se mostrado imensamente populares no âmbito doméstico. Porém, despertar o sentimento patriótico para unir o país traz grandes riscos, porque não tem nada que as autoridades do partido temem mais do que uma atividade política fora do script. Além disso, eles têm uma forte dependência da boa vontade das maiores potências estrangeiras para manter o ingresso de investimentos e a economia funcionando a todo vapor.

A nova atitude do governo enfrentará um grande teste neste fim de semana. Ele terá que fazer malabarismos para lidar com a visita do chanceler japonês, Nobutaka Machimura, e as possíveis manifestações contra o Japão convocadas pela internet e por celulares.