Título: Derrota diplomática do Brasil cria saia-justa
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/04/2005, Economia & Negócios, p. B3

País terá de decidir entre uruguaio que considerou inadequado para o cargo e europeu que defende protecionismo agrícola ROMA - A derrota diplomática do Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC) deixará o País numa situação no mínimo complicada. O Itamaraty terá de escolher agora se votará em um uruguaio classificado pelas autoridades brasileiras como inadequado ao posto de diretor da OMC, em um europeu que durante anos defendeu o protecionismo agrícola ou no representante da República de Maurício (Ilhas Maurício). Para analistas, a saia-justa que o País passará agora será resultado do próprio comportamento do governo. Ao lançar a candidatura a OMC do embaixador do Brasil em Genebra, Luis Felipe de Seixas Corrêa, membros do alto escalão do governo chegaram a dizer que não poderiam aceitar que o novo diretor da OMC fosse o candidato uruguaio Carlos Perez del Castillo. O uruguaio foi presidente do Conselho Geral da OMC em 2003 e o Brasil o acusou de não ter ouvido os apelos dos países em desenvolvimento ao propor regras de liberalização do setor agrícola.

A reação do Brasil foi unir forças a países como Índia e China e criar o G-20, grupo de economias em desenvolvimento. Por isso, muitos no Itamaraty ironizam e apontam Castillo como o "pai" do G-20. Na época, o Uruguai optou por ficar fora do bloco.

Mas hoje a situação é bem diferente. O Uruguai se tornou membro do G-20 depois da mudança de governo. Já Castillo, com o apoio de vários países do bloco criado pelo Brasil, segue na corrida para a direção da OMC. "Como é que vamos agora justificar um eventual voto a favor do Uruguai depois de ter dito o que dissemos?", afirmou um experiente diplomata brasileiro.

Porém, se o Brasil optar por não apoiar o Uruguai e sim o europeu Pascal Lamy, o sentido do Mercosul pode ser questionado. Lamy é o ex-comissário de Comércio europeu e por anos defendeu posições protecionistas no comércio, principalmente agrícola. Para complicar, Lamy disse há poucos meses que defendia a criação de "regras de gestão internacional" de florestas tropicais, entre elas a Amazônia, afirmação criticada pelo governo brasileiro.

Resta saber se o Brasil estaria disposto a apoiar o candidato das Ilhas Maurício, o chanceler Jaya Cuttaree, que defende a manutenção de regras de preferências comerciais entre países mais pobres e a Europa e os Estados Unidos.

Enquanto o Itamaraty busca respostas a essas questões e sobre como explicará sua posição à opinião pública, outra medida que se especula seria a transferência do embaixador Seixas Corrêa para a embaixada em Roma. Para isso, porém, o atual embaixador do Brasil na capital italiana, o ex-presidente Itamar Franco, terá de ser removido, algo nem sempre fácil.

Na missão do Brasil em Genebra, a campanha conduzida por Seixas Corrêa praticamente o tirou do dia-a-dia das negociações da OMC. Foram freqüentes as viagens a Genebra do subsecretário-geral de Assuntos de Integração do Itamaraty, embaixador Clodoaldo Hugueney.