Título: Eletrobrás tem assembléia ameaçada
Autor: Márcio Anaya
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/04/2005, Economia, p. B4

A polêmica envolvendo um empréstimo compulsório instituído na década de 60, que já motivou quase duas mil ações na Justiça contra a Eletrobrás, promete esquentar. A empresa Plastifica Industrial, credora da energética, prepara uma ação cautelar pedindo a suspensão da assembléia de acionistas marcada para 28 de abril, que debaterá o assunto. O questionamento diz respeito ao real valor do patrimônio divulgado pela estatal. Segundo a diretora financeira da Plastifica, Letícia de Carvalho Martini, a idéia é impedir que seja votada a conversão de créditos de clientes industriais em ações da Eletrobrás, como quer a empresa, até que haja um parecer legal sobre o valor patrimonial dos papéis. A executiva argumenta que o balanço está "inchado" em R$ 32,5 bilhões por registros patrimoniais de coligadas e por R$ 5,4 bilhões em dividendos não distribuídos, entre outros itens. A Eletrobrás disse que os itens estão contabilizados "de acordo com a legislação vigente".

Pelos cálculos da Plastifica, o valor patrimonial das ações da energética é de aproximadamente R$ 50 por lote de mil - muito abaixo dos R$ 130 indicados nas demonstrações financeiras. A questão é relevante para os credores pois significa a precificação dos ativos que receberão como pagamento pelo empréstimo. Quanto mais alto o preço, menos papéis eles terão direito. A discussão se agrava quando se compara o valor patrimonial (R$ 130) à cotação atual das ações da Eletrobrás na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), na casa de R$ 33, uma diferença de 75%.

O próprio critério de converter as ações pelo valor patrimonial, e não pelo preço de mercado, já motivou queixas de credores. A companhia diz estar amparada tanto na lei que criou o empréstimo compulsório quanto num parecer favorável da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Os desdobramentos de novas questões legais, no entanto, podem elevar o volume da reserva feita pela estatal justamente para fazer frente a eventuais derrotas nos tribunais. Tal provisão alcançou R$ 1 bilhão no balanço de 2004, 43% mais do que no ano anterior.

A Eletrobrás vê o risco de perda das ações como "possível" e afirmou que a reserva foi feita por conservadorismo. Analisando o assunto apenas do ponto de vista contábil, o presidente nacional do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon), Edison Arisa Pereira, disse que o procedimento está correto.

Segundo ele, as boas práticas determinam ainda que a reversão da provisão só deve ser feita depois de uma decisão judicial definitiva para os processos. Tal cenário, porém, parece estar bem distante. A própria companhia estima, em notas explicativas de resultado, que o prazo médio para uma solução final dos processos em curso é de oito a dez anos.