Título: Supremo derruba intervenção em hospitais municipais do Rio
Autor: Mariângela Gallucci
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/04/2005, Nacional, p. A7

Dois anos e quatro meses após a posse, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sofreu ontem sua primeira grande derrota no Supremo Tribunal Federal (STF). Por unanimidade, os ministros do STF derrubaram a intervenção federal nos Hospitais Municipais Souza Aguiar e Miguel Couto, do Rio, determinada em 10 de março por Lula. Os ministros do Supremo também proibiram o governo federal de usar servidores, bens e serviços contratados pelo município em quatro hospitais do Rio que retornaram à gestão federal. O presidente do STF, Nelson Jobim, disse que a decisão tem efeito imediato. Durante o julgamento, o advogado-geral da União, Alvaro Augusto Ribeiro Costa, defendeu o que chamou de requisição de bens e serviços municipais sob a alegação de que se tratava de estado de calamidade pública. No entanto, os ministros concluíram que era intervenção federal em município, o que é inconstitucional e contrário ao pacto federativo.

"O Brasil é uma República federativa", lembrou a vice-presidente do STF, Ellen Gracie. "Intervenção federal só se faz nos Estados ou no Distrito Federal", afirmou o ministro Carlos Velloso, ressaltando que é admitida exceção quando o município estiver em território federal. Também observaram que, se pudesse intervir, o governo teria de ter decretado estado de defesa, o que não ocorreu.

FRAUDE

Advogado-geral da União no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o hoje ministro do STF Gilmar Mendes disse que o decreto, na realidade, impunha uma "requisição à brasileira". "É um novo modelo de requisição", afirmou. Segundo o ministro Cezar Peluso, o decreto configurava uma "fraude constitucional". "O resultado prático é a intervenção", declarou.

O ministro Marco Aurélio Mello disse que o decreto era calamitoso e que se tratava de um "caso emblemático que revela, de forma escancarada, o momento vivido, de perda de parâmetros". Ele também discordou da justificativa usada pelo governo para decretar a intervenção, que foi o suposto estado de calamidade pública da saúde no Rio de Janeiro.

"Sou daqueles que vislumbro na situação de calamidade um ato imprevisto, que implique surpresa", disse. "A persistência desse decreto viria a implicar um retrocesso passados tantos anos do regime de exceção", afirmou.

Essa foi a primeira grande derrota do governo Lula no STF, onde, nos últimos tempos, só acumulava vitória jurídicas. Uma das mais importantes ocorreu no ano passado, quando o plenário concluiu que é constitucional cobrar a contribuição previdenciária dos servidores inativos e pensionistas. A decisão impediu perda de arrecadação da ordem de R$ 900 milhões por ano.