Título: Indefinição sobre salários esquenta clima nos quartéis
Autor: Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/04/2005, Nacional, p. A8

A falta de definição do governo em relação à promessa feita em setembro de dar 23% de aumento para os militares vem provocando grande inquietação nos quartéis de todo o País e preocupando os comandos das Forças Armadas. "Há um sentimento de preocupação muito grande", disse o comandante da Marinha, almirante Roberto Guimarães de Carvalho. Segundo ele, a situação salarial da categoria "é muito séria". O almirante não quis entrar em detalhes sobre as inquietações da tropa para não alimentar polêmica. Salientou, porém, que "tem de acreditar" no que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse anteontem no discurso para saudar os oficiais-generais promovidos, no Planalto, quando mencionou a possibilidade de aumento. Na ocasião, Lula falou que queria que todos soubessem que ele e o vice-presidente José Alencar, ministro da Defesa, vão trabalhar "não apenas com vontade política, mas com carinho" para ver se encontram uma forma de discutir a questão salarial e a recuperação das Forças Armadas.

Para o almirante Carvalho, o reajuste pretendido pela categoria é o que está previsto nos estudos realizados pelo Ministério da Defesa. Carvalho não quis citar números, mas os estudos iniciais indicavam defasagem da ordem de 33% no meio do ano passado. O governo pagou 10% em setembro, prometendo a segunda parcela - que não foi paga - para até o primeiro trimestre deste ano. No início da semana, novo estudo foi preparado pela Defesa, mostrando que a defasagem acumulada já chega, agora, a 37%. Mas não há previsão de pagamento nem dos 23% que ficaram restando, conforme acerto na época.

Alencar tem dito a todos que está tentando convencer a área econômica a cumprir a promessa. Os recursos não foram previstos no orçamento deste ano. A folha de pagamento anual dos militares é de R$ 21,6 bilhões. Se o reajuste for concedido a partir de maio, representará custo adicional de R$ 14,4 bilhões na folha.

ACAMPAMENTO

No ano passado, a polêmica sobre o aumento se repetiu. Em abril, mulheres de militares foram à Praça dos Três Poderes pressionar por salários. O protesto provocou a primeira grande crise entre o então ministro da Defesa, José Viegas, e os comandantes militares. Na época, Viegas preferiu dizer que desconhecia as reivindicações, apesar das inúmeras manifestações dos comandantes sobre a apresentação de propostas e estudos. Viegas deixou o cargo em novembro mas, antes, conseguiu pagar os 10% e prometeu o restante para até março.

Depois do protesto de anteontem no Quartel-General do Exército, as mulheres de militares prometem acampar a partir de terça-feira na frente do Ministério da Defesa e ficar lá até que saia o reajuste. Mais de 500 pessoas devem participar do movimento, que contará, pela primeira vez, com militares da reserva.

Os militares ficaram mais irritados ainda com a autorização do Planalto para um reajuste à Polícia Militar do Distrito Federal, que é paga com verba da União. Com o aumento, um major da PM do DF passou a ganhar R$ 10 mil - mesmo salário bruto de um general-de-exército. Um major das Forças Armadas, porém, recebe em torno de R$ 6 mil.