Título: Decisão inesperada: BC eleva os juros
Autor: Gustavo Freire, Renée Pereira, Célia Froufe
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/04/2005, Economia, p. B1

Pela oitava vez consecutiva, o Comitê de Política Monetária (Copom) manteve o conservadorismo e elevou os juros básicos da economia de 19,25% para 19,5% ao ano - a maior taxa desde setembro de 2003. A decisão, unânime e sem viés, contrariou a expectativa da maioria dos economistas, que esperava o fim do ciclo de alta da Selic na reunião deste mês. Desde setembro do ano passado, o Banco Central (BC) já aumentou os juros em 3,5 pontos porcentuais e colocou o Brasil na liderança das maiores taxas reais do mundo, em torno de 13% ao ano. Em breve comunicado após a reunião, o Copom manteve o mesmo tom dos últimos encontros e divulgou a frase que tem usado para explicar o avanço da Selic: "Dando prosseguimento ao processo de ajuste da taxa de juros básica, iniciada na reunião de setembro de 2004, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic para 19,50% ao ano, sem viés".

No mercado financeiro, a decisão surpreendeu os economistas. Dos 54 analistas consultados pelo Estado nos dias que antecederam a reunião, 38 apostavam na manutenção da Selic em 19,25% ao ano a partir deste mês até agosto, quando iniciaria o processo de redução da taxa. No setor produtivo, a reação não foi diferente. Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a decisão do Copom frustra, decepciona e preocupa a indústria e todo setor.

Na avaliação do ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega, sócio da Tendências Consultoria Integrada, o BC deve estar assustado com os índices correntes de inflação e com receio de que possa afetar a meta de 2006. Para ele, não há dúvida de que a inflação de 2005 ficará dentro da meta, mas acima do centro de 5,1%.

O ex-ministro ressalta, no entanto, que as pressões inflacionárias existentes hoje no País não são de demanda, mas de preços administrados e commodities. "O aumento dos juros terá efeito sobre os índices de preços, mas a um custo muito alto", argumenta ele. Além do petróleo e das commodities agrícolas influenciadas pela seca no Sul do País, os últimos aumentos autorizados para a tarifa de energia elétrica ficaram bem acima da expectativa.

O economista-chefe do Deutsche Bank Brasil, José Carlos Faria, também se surpreendeu com a decisão do Copom, já que esperava a manutenção da Selic. Na opinião dele, com mais esse aumento, o BC mostrou que não está preocupado com a desaceleração da economia.

Além disso, completa ele, pode ter pesado na decisão dos dirigentes o fato de o cenário mundial estar um pouco mais negativo. Ontem, por exemplo, a divulgação do índice americano de preços ao consumidor, acima da expectativa, trouxe turbulência para o mercado financeiro.

Outro alerta sobre a inflação americana veio do Livro Bege, do Federal Reserve (Fed, o BC americano), relatando que várias regiões dos EUA registraram pressões de alta nos preços entre o fim de fevereiro e o começo de abril e que as empresas foram capazes de repassar parte dos aumentos de custos para os consumidores.

Mas, apesar da alta do Copom, o economista-chefe da ABN Asset Management, Hugo Penteado, acredita que o aumento de 0,25 e não de 0,5 ponto porcentual pode ser uma sinalização do fim do ciclo de aperto monetário. Segundo ele, que apostava na manutenção da Selic, em termos de inflação, a decisão de ontem não terá nenhuma relevância em 2005. "Qualquer alteração agora só terá impacto em 2006."

Para o economista-chefe da Unibanco Asset Management (UAM), Alexandre Mathias, o BC fez um "seguro barato" ao elevar a Selic de 19,25% para 19,50% ao ano. Mathias previa estabilidade da taxa, mas, às vésperas da conclusão da reunião, na terça-feira, alterou sua previsão para alta de 0,25 ponto porcentual.

"O BC tinha bons argumentos para a manutenção da taxa, que era o que todos esperavam após o relatório de inflação e a ata de março. Mas os motivos que me levaram a alterar a projeção também devem ter sido os dos diretores da autoridade monetária", justificou ele, referindo-se aos atuais riscos de inflação e aos riscos do crescimento, que estão bastante minimizados. Mathias prevê, por enquanto, que em maio a decisão seja pela estabilidade da taxa básica de juros, a menos que os motivos atuais de preocupação não se dissipem.