Título: Mais uma ala do PT decide desafiar planos da cúpula
Autor: Ana Paula Scinocca
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/04/2005, Nacional, p. A6

Com críticas à condução do governo de Luiz Inácio Lula da Silva na economia e na área social, a Democracia Socialista (DS) lançará hoje a candidatura do deputado gaúcho Raul Pont à presidência do partido, desafiando José Genoino, que concorrerá ao segundo mandato no comando da sigla, em setembro. Dona de 17% das 81 cadeiras do diretório nacional petista, a DS é a principal corrente de esquerda do PT. Tem no governo o ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, muito cobrado pelos movimentos sociais. Pont é o segundo nome de oposição que pretende bater chapa com Genoino. Na semana passada, o Movimento PT - tendência de centro, que sempre se compôs com o Campo Majoritário do partido - apresentou a candidatura da deputada federal Maria do Rosário (RS), ignorando os apelos do ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu e surpreendendo o governo. Se não fechar acordo com a DS para candidatura única, a Articulação de Esquerda, por sua vez, deve lançar Valter Pomar, hoje terceiro vice-presidente do PT.

Ontem, já em São Paulo para o encontro de sua corrente, que termina amanhã, Pont fez duras críticas ao governo federal e ao atual presidente do PT, sem citá-lo nominalmente. "Sabemos que governar é difícil. Mas o governo está descompensado", comentou, disparando contra a política de alianças do governo Lula e a ausência de participação popular. "Essa política só trouxe derrotas ao partido. Não conseguimos avançar na reforma política nem aprovar a tributária. E a reforma da previdência realizada é incompleta", acrescentou Pont, para quem o PT deixou de ser uma sigla de militantes para se tornar uma legenda essencialmente eleitoral.

Para o deputado gaúcho, ex-prefeito de Porto Alegre, o PT tem de ser propositivo e ter autonomia em relação ao governo. "O diretório nacional se transformou em um órgão homologatório", observou.

Além de Pont e do ministro Rossetto, a prefeita de Fortaleza, Luizianne Lins, e o deputado Walter Pinheiro (BA) também fazem parte da DS. "Os investimentos na área social dependem da mudança nos rumos da economia. Esse é o motivo da nossa divergência com a tropa da maioria", comentou Pinheiro.

O campo majoritário, de Genoino e Dirceu, detém cerca de 60% das vagas do diretório, e o Movimento PT, do líder do Governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (SP), 10%.

MAIS ESQUERDA

De olho na união das correntes de esquerda, Pont não descartou ontem a hipótese de abrir mão de sua candidatura. Ainda não há, porém, um nome ou programa de consenso. Além da Articulação de Esquerda, que deve lançar Valter Pomar, a Ação Popular Socialista (APS) estuda ter candidato próprio para a presidência do partido, Plínio de Arruda Sampaio. "Qualquer que seja a decisão (de cada tendência de esquerda lançar chapa própria ou não) o cenário já é ótimo", avalia Pomar. Ele justifica o quadro citando a decisão do Movimento PT - até então sempre alinhado com o Campo Majoritário - de ter lançado candidatura própria no final de semana passado, em Brasília.

Pomar observa ainda que o lançamento de diversas chapas pode provocar o segundo turno da eleição para o comando do PT e, desta maneira, tirar das mãos do Campo Majoritário a maioria partidária.

Sobre a possibilidade de as esquerdas se unirem em torno de um único nome, diz: "Temos mais afinidades do que divergências. Mas a dificuldade hoje não é em torno de um nome, mas sim em função de diferenças políticas." Pomar cita como exemplo as reformas sindical e universitária. E destaca que enquanto a DS é favorável os dois projetos, sua tendência, a Articulação de Esquerda, é contrária aos modelos colocados pelo governo. Em comum, as tendências têm a crítica à política econômica do governo Lula.