Título: Espanha começa a julgar acusados de atuar na Al-Qaeda
Autor: Washington Post, AFP e EFE
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/04/2005, Internacional, p. A14

MADRI - Começou ontem em Madri o julgamento de 24 suspeitos de integrar a rede terrorista Al-Qaeda e de ter ajudado os envolvidos nos atentados de 11 de Setembro nos EUA. Um dos acusados, o jornalista sírio Taysir Aloni, da TV árabe Al-Jazira, se encontrava em prisão domiciliar e foi posto em liberdade por motivos de saúde. Mas ele terá de comparecer todos os dias a uma delegacia. Alony é acusado de ligações com a Al-Qaeda. Ontem também, a Suíça extraditou ontem para a Espanha o marroquino Mohamed Achraf, acusado de liderar uma célula terrorista que planejava explodir a Corte Suprema da Espanha.

A polícia espanhola já seguia vários suspeitos antes do 11 de Setembro. Duas semanas antes dos atentados, um imigrante sírio na Espanha recebeu um telefonema de Londres. O interlocutor informava que havia ingressado no "setor de aviação" e "as aulas estavam indo muito bem". E, misteriosamente, acrescentou que "a garganta do pássaro foi cortada".

O telefonema foi gravado pela polícia espanhola como parte de uma investigação de longo prazo sobre uma rede suspeita de radicais islâmicos, mas o possível significado dessa conversa só foi compreendido após o 11/9. Os promotores dizem agora acreditar que "o pássaro" era uma referência simbólica à águia americana e o interlocutor estava enviando a mensagem de que os seqüestros de 11 de setembro estavam prontos para acontecer.

A interceptação telefônica será uma peça chave da prova contra o sírio Imad Eddin Barakat Yarkas e dois outros suspeitos de serem membros da Al-Qaeda no julgamento, iniciado depois de uma investigação de três anos e meio sobre o papel que a Espanha pode ter desempenhado como uma local de preparação para o 11 de Setembro. Cada um deles foi enquadrado em 3 mil acusações de cúmplice de assassinato e participação em organização terrorista.

Yarkas, preso desde novembro de 2001, e os outros dois negam as acusações. Eles são acusados de terem ajudado nos seqüestros conscientemente, fornecendo dinheiro e cobertura para dois dos chefes do complô, durante encontro numa cidade litorânea espanhola, dois meses antes dos atentados. O julgamento incluirá mais 21 réus acusados de crimes relacionados com terrorismo, o que torna este o maior processo penal na Europa referente à Al-Qaeda.

Até agora, ninguém foi processado com sucesso por exercer um papel no 11 de Setembro. Os tribunais alemães julgaram dois homens acusados de integrar a célula de Hamburgo que supervisionou os seqüestros, mas a condenação de um deles foi revertida e o outro foi considerado inocente. Nos EUA, Zacarias Moussaoui, um franco-marroquino, declarou-se culpado ontem (ler abaixo).

Passados mais de 43 meses dos seqüestros, restam consideráveis brechas na compreensão dos investigadores sobre como o plano foi executado. A expectativa é que os promotores apresentem novas evidências durante o julgamento mas, até agora, pouca coisa tem surgido que comprove diretamente que os réus foram participantes voluntários e conscientes conspiração de 11 de setembro. Nos julgamentos na Alemanha, os dois réus conseguiram se safar argumentando que estavam fazendo favores para amigos muçulmanos e nada sabiam sobre o plano.

"As provas que temos contra as pessoas juridicamente são bastante fracas", disse Rafael Bardaji, que foi consultor estratégico em segurança de José María Aznar, o primeiro-ministro da Espanha na época dos atentados. "Estou convencido de que eles participaram do complô, mas existe uma enorme lacuna entre o que achamos que fizeram e a possibilidade de provar a culpa deles. São acusados apenas de terem desempenhado um papel logístico", disse Antonio Remiro, professor de Relações Internacionais e Direito da Universidade Autônoma de Madri.