Título: Microcrédito muda e aposta na parceria de bancos com ONGs
Autor: Mariana Barbosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/04/2005, Economia, p. B4

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva lança nesta segunda-feira um programa de microcrédito dentro das linhas de atuação do banco Grameen de Bangladesh, instituição que inventou esse tipo de operação. Batizado de Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO), seu objetivo é ampliar o acesso ao crédito para microempreendedores da economia informal. Enviado ao Congresso por medida provisória, o programa foi aprovado com modificações há duas semanas, transformando-se em lei que será sancionada por Lula na ocasião.

Diante das dificuldades dos bancos privados em utilizar os 2% dos depósitos à vista para oferecer microcrédito, o novo programa foi criado para fortalecer e estimular a criação de entidades do terceiro setor especializadas em microcrédito, geralmente constituídas na forma de cooperativas de crédito ou de organizações da sociedade civil de interesse público (Oscips), uma versão mais aprimorada de organização não governamental (ONG).

Os bancos que quiserem operar com microcrédito produtivo poderão se associar às Oscips ou cooperativas e repassar os recursos do compulsório para que as entidades façam os empréstimos. A primeira parceria entre um banco e uma Oscip será anunciada na segunda-feira. Será um repasse de R$ 300 mil do Banco Popular do Brasil (BPB) para a VivaCred, Oscip com forte atuação na Favela da Rocinha, no Rio de Janeiro. Além de capitalizar a Oscip, a parceria simplifica e barateia a operação, na medida em que os clientes da VivaCred poderão fazer os pagamentos dos empréstimos, muitas vezes semanais, por meio de um cartão do BPB. Hoje, as Oscips trabalham com boleto bancário, que custa quase R$ 2. É um valor altíssimo, considerando que as parcelas nesse tipo de operação são de algumas dezenas de reais.

Para operar diretamente com o microcrédito, os bancos terão de montar uma estrutura similar à das Oscips, o que significa, entre outras coisas, montar um time de agentes de crédito. Em vez de esperar o cliente na agência, o agente vai até o cliente e mantém uma relação de proximidade com sua comunidade.

VANTAGENS

Segundo o assessor especial da Presidência, José Graziano, uma das vantagens da parceria entre bancos e Oscips ou cooperativas é que, na medida em que o empreendedor cresce e aumenta a necessidade de crédito, ele pode se transformar em cliente do banco. "O vínculo permite ao empreendedor aproveitar seu cadastro com a Oscip para pegar o empréstimo do banco a taxas melhores", diz Graziano, designado por Lula para tirar o programa do papel.

Além disso, o cliente da Oscip poderá ter acesso a outros serviços financeiros, como conta corrente e poupança, via bancos. O programa estabelece ainda que o empréstimo final para o empreendedor não poderá passar de 4% ao mês, incluindo aí todas as taxas administrativas.

O setor de microcrédito produtivo orientado no Brasil é restrito a algumas dezenas de entidades e era, até o governo Fernando Henrique, dependente de recursos do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). De 1998 até 2002, o banco repassou cerca de R$ 40 milhões. O programa ficou parado durante a gestão Carlos Lessa no BNDES e será retomado a partir de agora com aporte de R$ 200 milhões do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). O BNDES vai se concentrar no financiamento das grandes instituições, com necessidade de crédito de pelo menos R$ 1 milhão. Para repasses menores, o banco transferirá os recursos a bancos estaduais ou agências de fomento, para que emprestem às Oscips e cooperativas.

As entidades que quiserem atuar com o microcrédito produtivo orientado terão de atuar de forma padronizada, dentro de um plano de contas estabelecido pelo Banco Central. "A padronização dará mais transparência ao setor e permitirá a comparação entre instituições", diz o assessor especial do ministro da Fazenda Gilson Bittencourt.