Título: Um encontro com a democracia verde-amarela
Autor: Denise Chrispim Marin Expedito Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/04/2005, Nacional, p. A4

No Memorial JK, Condoleezza vibra com o contraste entre as questões levantadas por índia e juíza federal

A secretária de Estado, Condoleezza Rice, encontrou ontem no Memorial JK um pequeno extrato do que imagina ser a democracia brasileira. Depois de destacar a vantagem da diversidade multiétnica brasileira em sua palestra, Condoleezza assistiu a um debate com o contraste verde-amarelo. De um lado, uma índia do Alto Rio Negro, preocupada com a preservação do ambiente. Do outro, uma juíza federal que apresentou o ponto de vista indignado e legalista de um "não-índio" sobre a cidadania "dos aborígines" no Brasil. "É isso! Estou vendo a democracia viva. Uma democracia muito vibrante e dinâmica. Todo mundo pode debater essas questões", vibrou a secretária, provocando risos na platéia. "Eu disse ontem à noite que as grandes democracias multiétnicas são complexas, são difíceis. Há muita cacofonia, muito barulho. Mas alguém de nós preferiria viver em uma sociedade homogênea, chata? Isso que é maravilhoso na sociedade brasileira. É uma grande honra estar aqui", completou, entre aplausos.

Ao chegar ao memorial, Condoleezza posou para fotos com Ana Christina Kubitschek, neta de Juscelino Kubitschek, que elogiou na palestra. Embalados pela pregação democrática da secretária, os convidados sentiram-se à vontade para entrar em qualquer polêmica. Mesmo sem ocupar todas as 310 poltronas e as 90 cadeiras adicionadas para o evento, o que se viu foi um clima quase de torcida.

A índia Rosimere Teles participava da mobilização nacional Terra Livre e estava acampada, junto a seus companheiros, na Esplanada dos Ministérios desde segunda-feira, quando recebeu o convite para ouvir Condoleezza. Indicada para fazer-lhe uma das perguntas, Rosimere destacou sua preocupação com o avanço da fronteira agrícola nas áreas de preservação.

A juíza Selene Almeida, que se notabilizou nos anos 90 por decretar a prisão do então presidente do Banco Central Ibrahim Eris, discordou e, indicada para a pergunta seguinte, fez discurso que mexeu com a platéia. Ela detalhou os direitos do indígena no Brasil, deu orientações legais sobre áreas de preservação e arrancou risos e muxoxos. Mas Condoleezza vibrou.

À pergunta de um afro-brasileiro, a afro-americana Condoleezza falou da infância no sul dos EUA em época em que os cidadãos negros não podiam freqüentar escolas e lanchonetes reservadas a brancos. Também recordou a conversa de anteontem com a ginasta Daiane dos Santos, na embaixada americana, em russo. "É o idioma que temos em comum", disse a especialista em assuntos da ex-União Soviética.