Título: Lula diz que biodiesel é Proálcool de seu governo e redenção do País
Autor: Liege Albuquerque e Cida Fontes
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/04/2005, Nacional, p. A7

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou os 12 projetos em andamento de usinas de biodiesel no País, como a que inaugurou ontem à tarde em Belém, como a "redenção do País" em relação ao Proálcool, projeto da década de 70 em alternativa à crise do petróleo. "No começo do governo, o Roberto Rodrigues (ministro da Agricultura) entrou na minha sala e me convenceu a criar um grupo de estudos para o biodiesel. Acredito que, com esse projeto, a gente não vai mais dormir com medo da guerra entre os países que produzem petróleo nem com medo de o nosso acabar, mas sim vamos tratar de plantar mamona, soja e dendê para lutar pela independência do nosso país", afirmou Lula.

Dirigindo-se a cerca de 500 pessoas, o presidente disse: "Logo vocês vão ver um trator como aquele ali tendo um pouco do trabalho de vocês lá dentro, com o biodiesel. Nosso sonho é ver carro a biodiesel, caminhões e ônibus."

Com várias faixas pedindo luz elétrica à região, o presidente prometeu trazer o Luz para Todos à comunidade. A população também pediu a construção de uma ponte. "A ponte que estão me pedindo não posso prometer, porque têm outras 3 mil para fazer. Nunca vi tanta queda de ponte neste país, acho que elas são malfeitas. Algumas caem por causa da chuva, outras só de bater o pé", disse, provocando risos.

Lula fez um discurso curto, ao chegar às 12h35 (hora local) em Moju, a 200 quilômetros de Belém, onde há uma plantação de palma, de onde se extrai o dendê. Antes do discurso, em mais uma quebra de protocolo, levantou cordas de segurança e abraçou a platéia, formada pela comunidade de Arauaí e Soledade. Os agricultores e suas famílias aguardaram o presidente por mais de três horas.

Levado pelo prefeito da cidade, Iran Lima (PMDB), depois do discurso, Lula inaugurou uma escola construída às pressas, em meio a um lamaçal coberto com areia para a passagem do presidente. "Estou feliz com a vinda do presidente porque até a semana passada eu dava aulas naquela casa de palha vizinha à escola", contou o professor José Maria Trindade, de 27 anos. A escola foi inaugurada com apenas uma das três salas mobiliada com carteiras e quadro negro.

Segundo a ministra das Minas e Energia, Dilma Rousseff, o porcentual permitido desde dezembro de 2004, de misturar até 2% do biodiesel ao diesel produzido pelo país significa 800 milhões de litros por ano do biodiesel. "Parece um número tímido, mas essa mistura possibilitará uma economia de U$ 160 milhões por ano com importação de petróleo", afirmou. O País, segundo a ministra, consume anualmente 40 bilhões de litros de diesel.

LULA/BIODIESEL/VALE ESSA Cida Fontes Enviada especial BELÉM - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiu ontem, ao inaugurar uma usina de biodiesel, que o aumento do preço do petróleo poderá levar o governo a mudar o plano para acelerar a introdução desse "combustível limpo" no mercado brasileiro.

"Se o petróleo continuar subindo como está subindo, podem ficar certos que o biodiesel vai ser utilizado em maior quantidade e num prazo muito menor do que todos nós estamos pensando", afirmou o presidente, dirigindo-se à ministra das Minas e Energia, Dilma Rouseff, que o acompanhou na visita à usina.

A presença de Lula a Belém marcou também o início da comercialização do biodiesel produzido a partir da palma ( dendê), em um posto da BR Distribuidora no estado do Pará. Num discurso didático para uma pequena platéia de empresários de vários estados que estão produzindo biodiesel - um combustível oriundo de oleagionosas como soja, mamona, girassol, dendê e outras - Dilma já havia ressaltado a possibilidade de a meta ser antecipada. "Isso mostra que, quando se faz um projeto sério e em parceria, é possível desenvolver de forma acelerada cumprindo e ultrapassando metas", disse Dilma, que falou antes de Lula.

Em dezembro do ano passado, o governo autorizou o uso comercial do biodiesel com a mistura de 2% do produto ao diesel de petróleo. Pela lei vigente, até 2007 essa mistura será autorizativa passando a compulsória de 2008 a 2012. A partir de 2013 será de 5%.

"Nós vamos transformar o biodiesel numa segunda fonte da nossa matriz energética, para tornar o Brasil mais independente da necessidade do petróleo que um dia pode acabar", disse o presidente.

Lula ressaltou o tom mais moderado da ministra, afirmando que, por ser mulher, ela "é mais equilibrada e provavelmente tenha mais juízo". Por isso, teria citado as metas, dentro de uma linha correta de planejamento.

Mas o presidente buscou um tom ainda mais otimista e menos técnico.

Além de reagir às constantes altas do petróleo, Lula procurou vincular a opção do biodiesel ao protocolo de Kioto que poderá motivar a criação de um mercado de energia renovável.

O protocolo começou a vigorar em fevereiro deste ano e obriga os países industrializados a reduzirem em 5% suas emissões de gases que provocam o efeito estufa e, relação aos níveis de 1990. Esses países devem cumprir essa meta entre os anos de 2008 e 2012." Certamente o mundo vai precisar utilizar todos os tipos de combustíveis que não o derivado do petróleo", disse, enfatizando que aí entra a capacidade do Brasil de transformar o biodiesel em segunda fonte a matriz energética do País.

Na mesma linha do ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, o presidente Lula chamou atenção para a necessidade de reduzir a dependência do petróleo que está sujeito a guerras entre os países produtores. Segundo ele, o que falta, na verdade, é determinação para transformar a busca de alternativas energéticas em política de Estado.

O presidente destacou também a necessidade de as regiões norte e nordeste, menos desenvolvidas e mais dependendentes do diesel, terem prioridade na implantação dessa política. Além de ser um programa estratégico de inclusão social, contribui para o aumento de empregos e expansão da agricultura familiar.

A usina inaugurada por Lula, na região metropolitana de Belém, tem capacidade de produzir 24 milhões de litros de biodiesel por ano e, segundo informações do governo paraense, cerca de 50 mil famílias poderão ser beneficiadas com a produção do biodiesel, a partir do dendê. O Pará possui cinco milhões de áreas aptas ao dendê e outros dois milhões de áreas propícias para a plantação.