Título: Juro alto vai ao banco dos réus
Autor: Sheila D'Amorim, James Allen, Vânia Cristino
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/05/2005, Economia, p. B4

O debate organizado pelo Ministério da Fazenda para comemorar os cinco anos de implantação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) acabou virando um palanque para críticas à política de juros altos do governo. Ao lado do secretário do Tesouro, Joaquim Levy, economistas, secretários estaduais e especialistas foram unânimes em apontar a elevada taxa de juros como "um equívoco do governo". Ao propor que o Banco Central leve em consideração nas suas decisões para controlar a inflação também o impacto dos juros nas contas públicas, o ex-ministro do Planejamento e atual secretário de Economia do Espírito Santo, Guilherme Dias, chegou a dizer que a política de juros "é um fenômeno extraterrestre". Segundo ele, o Brasil avançou bastante na questão fiscal, com economias significativas nos últimos anos. No entanto, tão importante quanto esses resultados, conhecidos no mercado como superávit primário, é controlar também as despesas financeiras, que incluem os gastos com pagamento de juros sobre a dívida pública. E isso, ressaltou, "tem de ser compartilhado pelo conjunto de atores da política econômica". "De algum modo, o mandato do BC para controlar a inflação tem de olhar também o lado fiscal. Não dá para ficar com um lado só. A taxa de juros no Brasil é inexplicável", afirmou, destacando que não é possível que os juros sejam classificados "na categoria das coisas impossíveis". Citando Albert Einstein, disse: "Certas hipóteses são impossíveis até que se prove o contrário."

Um levantamento apresentado pelo consultor de Finanças Públicas Amir Khair mostra que a taxa de juros no Brasil é a maior num ranking de 23 países em desenvolvimento. Enquanto a taxa média entre as economias emergentes é de 7% ao ano, no Brasil a Selic está em 19,5% ao ano. "Estamos com uma grande distorção da taxa de juros, e isso terá repercussão na área fiscal. Considerando as condições brasileiras, os juros deveriam estar em 7,7% ao ano."

Escolhido pelo secretário do Tesouro para a mesa de debate, Khair, ex-secretário de Fazenda da Prefeitura de São Paulo na gestão de Luiza Erundina, disse também que a política de juros do BC tem sido ineficiente para conter a inflação. Isso porque os spreads (diferença entre o custo de captação dos bancos e o valor cobrado dos clientes) são altos e as elevações na Selic não provocam o impacto desejado na economia real.

RECESSÃO

As críticas à política de juros fizeram eco também no Congresso Nacional e na Esplanada dos Ministérios. O ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, voltou a defender uma meta de inflação maior para evitar que o BC tenha de elevar os juros. "O Copom não define as diretrizes, mas acaba levando a fama por perseguir a meta de inflação, que é definida pelo Conselho Monetário Nacional."

Mesmo assim, Berzoini não concorda com a avaliação do Instituto para Estudos do Desenvolvimento Industrial (Iedi), de que o País está na ante-sala da recessão. "Todos os indicadores apontam para uma demanda aquecida no mercado interno e as exportações estão batendo recorde. Portanto, não há a menor possibilidade de recessão. O que pode haver é uma acomodação ou desaceleração."

Para o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT/SP), o País não caminha para recessão. Um dos maiores defensores da mudança na meta de inflação,Mercadante acha a previsão "muito pessimista". Ele também rebateu críticas do senador Tasso Jereissati (PSDB/CE), que afirmou que a política econômica está "sem rumo".