Título: De fora, EUA terão de esperar para ver
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/05/2005, Nacional, p. A5

A recusa do governo brasileiro em aceitar o pedido dos Estados Unidos de enviar um observador à Cúpula América do Sul e Países Árabes não alterou a disposição pública do governo do presidente George W. Bush de mostrar tranqüilidade em relação ao evento. Ciente de que atitude diferente tenderia a dar ao encontro importância maior do que a que ele tem e provocar reações que não interessam aos EUA, os assessores da Casa Branca e do Departamento de Estado evitaram antecipar avaliações sobre seu significado. Indagado, quinta-feira, sobre relatos de que a declaração final da cúpula incluiria tese de apoio ao direito dos povos de opor-se a ocupações estrangeiras, o porta-voz do Departamento de Estado, Richard Boucher, disse: "Não sabemos se vão usar essa linguagem. Vamos ter de esperar para ver."

Alguns altos funcionários não escondem sua perplexidade com a cúpula - menos por temer seu propósito do que por não compreendê-lo no quadro dos interesses proclamados pelo governo brasileiro. "No exercício de liderança internacional é importante que a ambição corresponda ao interesse", diz alta fonte oficial. Em privado, funcionários brasileiros ouviram de colegas americanos manifestações de apreensão quanto à possibilidade de a cúpula sair do roteiro e produzir algum fato que perturbe o processo de paz no Oriente Médio e os incipientes avanços da democracia no mundo árabe, que são hoje as bandeiras da política externa americana na região.

Oficialmente, os EUA "aplaudem um evento cujo objetivo é fortalecer laços entre a América Latina e o mundo árabe", disse Boucher. Ele acrescentou que a secretária de Estado, Condoleezza Rice, conversou com líderes de Brasil, Colômbia e Chile na visita que lhes fez. "Como estarão tendo essa reunião, ela discutiu com eles as oportunidades para cooperação e os atualizou sobre nossa avaliação de onde estamos no processo de paz no Oriente Médio, assunto que provavelmente discutirão."

Em Brasília, Condoleezza repetiu o que dissera ao ministro José Dirceu (Casa Civil) no início de abril em Washington. "Ela insistiu que a cúpula é uma oportunidade para os países da América Latina, que fizeram a transição de regimes ditatoriais para a democracia e estão fazendo as reformas, compartilharem a experiência, para que os líderes árabes possam avaliar a importância da democracia no progresso social e econômico dos povos", disse um participante do encontro. A afirmação mostra que Washington vê na cúpula um evento de cunho político e não se convenceu de que seu propósito é econômico, como diz o Brasil.