Título: Venda de caças vira feira de pechincha
Autor: Roberto Godoy
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/05/2005, Nacional, p. A11

O bureau aeroespacial Sukhoi, russo, está oferecendo ao Ministério da Defesa jatos de ataque Su-27 Flanker - para pronta entrega e a baixo preço. Os franceses da Dassault propõem agora o que não admitiam há três meses: a entrega de 12 Mirage 2000, usados e revitalizados, por pouco mais de US$ 50 milhões. Já os suecos do consórcio Saab estão dispostos a alugar de 12 a 24 unidades do moderno JAS-39 Gripen novos em folha. Não que o fabricante tenha aviões em estoque: os supersônicos aos quais se refere seriam desligados da frota da aviação militar da Suécia. Ao fim do acordo, a Força Aérea Brasileira (FAB) poderia optar entre a compra definitiva do lote - incorporando tecnologia atualizada conforme os padrões da época - e a renovação do contrato de arrendamento.

Os americanos da Lockheed-Martin melhoraram os termos de sua negociação inicial: aceitam ceder a tecnologia dos sistemas eletrônicos dos F-16 Falcon que a FAB eventualmente venha a escolher, ainda que sejam de segunda mão. Consideram que não há restrições do governo americano para a venda de armas modernas, como os mísseis BVR de combate aéreo, com alcance além de 40 quilômetros, e bombas inteligentes.

Com essas propostas, anunciadas todas há uma semana, a concorrência FX do Comando da Aeronáutica, aberta em 2000 para comprar no mercado internacional um lote de 12 caças de alto desempenho, e encerrada no fim de 2004 sem que nenhuma decisão tenha sido tomada, teima em se manter viva - por iniciativa das empresas interessadas no contrato. Nos novos termos, o valor da transação, qualquer que seja o formato, será bem inferior aos US$ 700 milhões da competição original, oficialmente terminada.

MIRAGE, O FAVORITO

O olho de todos os produtores está no longo prazo. O objetivo da FAB é desenvolver um programa que permita produzir caças avançados no País. O plano é ter pelo menos 120 aviões dessa classe em condições de emprego até meados de 2015 ou pouco mais.

Na fase atual, em que o jogo mudou de lado e a ofensiva passou do campo da procura para o da oferta, a Dassault aparece como a favorita nos entendimentos de eventual encomenda, com uma flotilha de 12 caças Mirage 2000 usados e modernizados, vistos como sucessores naturais dos velhos Mirage IIIE/Br que serão desativados em 31 de dezembro. Em janeiro o vice-presidente de Defesa da Dassault, Ives Robbins, negou em nota oficial que a indústria - sócia minoritária da Embraer - estivesse considerando esse tipo de transação. Na época a informação havia sido publicada pelo Estado com base em declarações de fontes da própria empresa.

Os Mirage do pacote proposto saíram da linha de montagem nos anos 80. Talvez alguns sejam dos anos 90. Todos passariam por ampla atualização da tecnologia embarcada, de forma a serem mantidos em ação até 2020 pelo menos. O custo passa pouco dos US$ 55 milhões, mas não se sabe se abrange a engenharia de modernização. O governo da França acha que essa aquisição "encaminha o Brasil em direção ao super caça Rafale, o mais sofisticado da Europa, em fase de recebimento pela Armée de l'Air", garante um diplomata do setor de relações comerciais.

O movimento mais radical, porém, foi da agência russa de exportações, Rosoboronexport. Com aval do Kremlin, o escritório regional para a América Latina da fabricante Sukhoi - que é consorciada da Avibrás Aeroespacial, de São José dos Campos - alterou profundamente a oferta que integrava o programa FX e substituiu o avião oferecido na disputa FX. No lugar do Su-35, um projeto arrojado, mas ainda em desenvolvimento, está agora o modelo da geração anterior, o Su-27SKM.

Utilizado pela aviação russa e exportado para a Índia e a China, é um gigante de 21,7 metros de comprimento e 14,5 metros de envergadura. Voa a 2.495 km/hora em grande altitude e faz bombardeio ao nível do mar a 1.347 km/hora. Leva 8 toneladas de cargas de ataque - entre as quais 8 mísseis leves, duas bombas de 900 quilos e dois mísseis cruise médios - por um raio de ação estimado em 4,7 mil quilômetros. De acordo com Vladimir Kolnoochenko, diretor regional da Sukhoi, "é viável considerar a retirada de 12 aeronaves dos estoques da Defesa russa".

O grupo Saab discute modelo semelhante, envolvendo o compacto Gripen, eletronicamente avançado, capaz de transportar 6.500 quilos de armamento, porém limitado pela autonomia básica estimada em 1,1 mil km.