Título: Industriais da Argentina dão ultimato ao Brasil
Autor: Tânia Monteiro e Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/05/2005, Nacional, p. A7

A União Industrial Argentina (UIA) deu ontem um ultimato ao Brasil: ou avança com o projeto de integração do Mercosul ou o abandona de vez e deixa seus sócios livres para definirem suas estratégias de inserção na economia mundial. Segundo José Ignácio de Mendiguren, ex-ministro da Produção da Argentina que hoje é vice-presidente da UIA, o governo Lula não tomou nenhuma iniciativa para pôr em prática seu discurso político de prioridade ao Mercosul. O último auxílio à Argentina, disse, veio do governo Fernando Henrique Cardoso, em 2002. A delegação da UIA foi recebida ontem à tarde pelos ministros do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, e das Relações Exteriores, Celso Amorim. Os encontros mostraram que as críticas do chanceler Rafael Bielsa ao Brasil e as ameaças de novas barreiras a produtos brasileiros, na semana passada, têm mais substância que "fumaça", como Amorim achava.

"Vamos dizer: Brasil, somos sócios ou não? Vocês querem avançar na integração que definimos no Tratado de Assunção ou querem outra coisa?", contou Mendiguren. "Queremos reindustrializar a Argentina e o Brasil é chave para nós. Mas antes nós precisamos saber se o Brasil está interessado nos compromissos que assumiu. O Mercosul, como está hoje, não adianta nada para nós."

Para o presidente da UIA, Héctor Méndez, o Mercosul é preciso resgatar a eqüidade de custos e benefícios da integração. Ele retomou a velha queixa de que o Brasil usa mecanismos "nada santos" para atrair investimentos que estão na Argentina. " Temos de nos sentar à mesa de negociações para redefinir o Mercosul." Os argentinos querem a adoção de salvaguardas automáticas para situações de desequilíbrio entre as economias dos dois países e quando houver aumento de importações dos vizinhos em prejuízo a setores locais.

Mendiguren disse que a medida seria temporária, enquanto não há políticas harmonizadas de investimento e a Argentina não cria seu organismo de financiamento nos moldes do BNDES. Na semana passada, porém, Amorim advertiu que o Brasil não mudou a posição contra as salvaguardas.

JANTAR

Numa tentativa de acertar os ponteiros, os presidentes Lula e Néstor Kirchner se reúnem hoje à noite para discutir as pendências entre Brasil e Argentina. O encontro será n Itamaraty, pouco antes do jantar que Lula oferecerá aos chefes de Estado e de governo dos países árabes e da América do Sul.

Ontem os primeiros passos dessa reaproximação já foram dados, com o jantar oferecido por Lula, na Granja do Torto, a Kirchner e ao presidente da Venezuela, Hugo Chávez. O Planalto evitava tratar o encontro de Lula e Kirchner hoje como um passo ao entendimento, alegando que as relações entre os dois países sempre foram boas.

Ontem, Kirchner chegou ao Torto por volta das 21 horas e Chávez, às 21h20. Sua comitiva provocou um pequeno tumulto, pois estava em três carros sem credenciamento. Ao fim do jantar, por volta da meia-noite, Amorim informou que foi acertado que dia 10 de junho os ministros da Economia dos três países vão se reunir em Buenos Aires para discutir questões econômicas. Hoje, segundo ele, os ministros de Energia da Venezuela e da Argentina se reúnem com a ministra Dilma Rousseff, para identificar projetos de interesse dos três países com vistas a parcerias.