Título: Árabes e Chávez usam encontro para atacar Israel e Estados Unidos
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/05/2005, Nacional, p. A6

Logo depois do morno discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dois líderes árabes esquentaram o clima político da Cúpula América do Sul e Países Árabes. O presidente da Argélia, Abdelaziz Bouteflika, que também preside a Liga Árabe, e o secretário-geral da Liga Árabe, Amre Moussa, defenderam a retirada das tropas de Israel dos territórios palestinos, que ocupam desde 1967. O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, ajudou a elevar o tom político, ao atacar o "imperialismo" dos Estados Unidos - sem citar o país. Ele propôs que árabes e sul-americanos formulem uma "agenda preventiva" contra as iniciativas dos EUA no Oriente Médio e no seu país. "A Venezuela está ameaçada pelo imperialismo e continua sob a pressão deste império mais poderoso do mundo", afirmou, destacando que foi vítima de um golpe de Estado em 2002. "Essa guerra tem cheiro de petróleo."

As posições sobre a Palestina, compartilhadas historicamente pelo Brasil, e a legitimação do direito à resistência em caso de ocupação estrangeira devem claramente ser citadas na Declaração de Brasília, com a qual as delegações dos 34 países encerram hoje a cúpula. Isso deve azedar as conversas que o chanceler Celso Amorim terá no fim do mês na visita a Tel Aviv. Textualmente ou não, o documento condenará iniciativas de Israel.

Ao discursar depois de Lula na abertura, Bouteflika assinalou que a Palestina vive a "tragédia" da negação da Justiça há meio século e será importante para árabes e palestinos definirem "posição comum" sobre isso. Também ressaltou que a ocupação do Iraque por forças estrangeiras - no caso, da coalizão comandada pelos EUA - é igualmente "fonte de grande inquietação" e "assunto sério" .

"Devemos chamar a atenção da comunidade internacional para contribuir com uma solução final e definitiva para a Palestina e fazer com que Israel respeite as leis internacionais e aceite a paz negociada e o direito soberano do povo palestino. Israel tem de se retirar dos territórios ocupados", afirmou Bouteflika. "Os territórios palestinos continuam ocupados e esperamos que Israel se retire. Essa é uma demanda justa e correta do povo palestino. Ignorar esse pedido seria o mesmo que impor o caos internacional e uma sucessão de conflitos", reforçou Moussa.

O tom político seguiu na contracorrente da expectativa do governo brasileiro, que esperava uma cúpula concentrada nas oportunidades comércio e investimentos. A intenção de não permitir que temas políticos dominassem a cúpula prevaleceu na organização e tornou-se ainda mais insistente depois da visita a Brasília da secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, no fim de abril.

Mas diplomatas acostumados com iniciativas árabes já achavam impossível contornar as manifestações contra Israel, posição que líderes árabes reiteram em toda reunião internacional. Eles ponderaram ainda que a condenação à ocupação de territórios palestinos por Israel é posição histórica do Brasil e o fato de o tema ter merecido pelo menos um parágrafo da declaração final indica o consenso dos 34 participantes da reunião.