Título: Na contramão, líder do Iraque defende tropas dos EUA
Autor: Lourival Sant'Anna
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/05/2005, Nacional, p. A8

Ele lutou pelo direito à autodeterminação da minoria curda no Iraque (20% da população), enfrentando o ditador Saddam Hussein, que não hesitou em testar suas armas químicas no Curdistão, matando milhares de pessoas nos anos 80. Nem nos sonhos mais delirantes o ex-combatente curdo Jalal Talabani, nascido na pequena Koy Sanjak, província de Irbil, imaginou se tornar um dia presidente de todo o Iraque. Numa inversão de papéis, o velho guerrilheiro, hoje um rotundo senhor de 72 anos, que lutou a vida toda contra a supremacia árabe sunita, tem diante de si a difícil tarefa de conter a insurgência sunita. Em entrevista ao Estado, Talabani, eleito no mês passado pela Assembléia Nacional, defendeu a permanência das tropas americanas no Iraque, apesar de a declaração final da Cúpula América do Sul-Países Árabes pedir a soberania e independência do país.

O senhor deixou o Iraque num momento delicado. Por que esta cúpula é tão importante?

Esta é a primeira vez nas relações dos países árabes e sul-americanos que se realiza uma conferência como esta. Como estamos olhando para o Brasil como um país muito importante, e temos um respeito especial pelo presidente Lula, quisemos participar.

E quanto aos resultados?

O resultado foi bom. A respeito do Iraque, a declaração aprovada foi boa, apoiando eleições, democracia, o governo formado pela Assembléia Nacional, condenando o terrorismo, apoiando a soberania e a independência do Iraque.

A independência do Iraque significa o fim da presença americana no país?

Isso não é verdade. Há soldados americanos na França, na Alemanha, no Japão, na Arábia Saudita, no Catar. Por acaso esses países não são independentes? A presença de forças estrangeiras não significa ocupação. Nós esperamos o dia em que possamos terminar de reformar nosso exército e nossas forças policiais e pedir aos americanos que voltem para casa.

O exército iraquiano se fortalecer para bloquear o terror que vem de países vizinhos, não é?

Sim, é verdade.

O senhor acredita na estabilidade do governo em formação?

Acredito. O governo tem grande maioria no Parlamento. Ele representa duas principais forças, a Coalizão e a Aliança do Curdistão.

Alguma vez o senhor, um líder curdo, sonhou em ser presidente de todo o Iraque?

Eu não pensava em nenhum cargo oficial. Só pensava em mudar o regime. Nunca pensei em me candidatar a presidente do Iraque.

Como foi sua conversa com o presidente Lula?

Foi muito amigável. Expliquei a ele a situação do Iraque. Ele manifestou apoio à luta para recuperar a independência. Falamos de construir novas relações políticas e econômicas.

No passado, o Brasil exportou armas para o Iraque...

Não queremos armas. Queremos outros tipos de produtos.

Lula lhe perguntou sobre o brasileiro seqüestrado no Iraque?

Ele me pediu para saber o que aconteceu com ele. Não sabemos agora. Mas prometi que faremos o possível para descobrir.