Título: O que o STF autorizou
Autor: Christiane Samarco e Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/05/2005, Nacional, p. A4

O ministro do STF Marco Aurélio Mello abriu ontem inquérito contra o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e determinou a realização de várias diligências, dentre as quais a quebra de seu sigilo fiscal. As informações, porém, ficarão protegidas. Só Meirelles e o Ministério Público Federal poderão consultá-las.

Para o ministro, há indícios de prática delituosa que justificam a investigação. Ele tomou a decisão a pedido do procurador-geral da República, Claudio Fonteles, que suspeita do envolvimento de Meirelles com sonegação fiscal, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e crime eleitoral. "Para chegarmos ao trancamento do inquérito, teríamos de perceber uma inocência escancarada", explicou Marco Aurélio. "Vamos abrir o embrulho e ele (Meirelles) é interessado na abertura." Ele disse que sua decisão não levou em conta eventuais reflexos no mercado: "Não poderia privilegiar a estabilidade do mercado a ponto de prejudicar um bem maior que é a elucidação dos fatos."

O inquérito já era esperado pelo governo. A decisão é manter Meirelles no cargo, segundo informou o presidente Lula em entrevista há duas semanas. "Investigação é investigação", disse Lula. "Só posso tomar uma atitude quando houver conclusão." Ele acrescentou que não iria prejulgar ninguém. O despacho de Marco Aurélio foi recebido com "tranqüilidade" na área econômica. A avaliação é que o texto se ateve aos aspectos técnicos do caso.

Em sua decisão, Marco Aurélio observou que o próprio presidente do BC afirmou estar empenhado em esclarecer as suspeitas. "Tratando-se de homem público, detentor de cargo da maior importância no cenário nacional, outra postura não seria de aguardar. É que os agentes públicos, os servidores públicos em geral, têm posição diversa do cidadão comum, ficando mitigada a privacidade, presentes os interesses coletivos, em face da transparência necessária quando em jogo a administração pública", argumentou o ministro.

Marco Aurélio admitiu que Meirelles pode recorrer de sua decisão ao plenário do STF, que é formado pelos 11 integrantes do tribunal. Essa estratégia, porém, foi descartada pelos advogados do presidente do BC. Eles acham que isso só atrasaria as investigações e estão convencidos que podem esclarecer todas as suspeitas.

DOCUMENTOS

Pelo despacho de Marco Aurélio, a Receita e o Banco Central terão de fornecer cópias de vários documentos. Foi pedida, por exemplo, cópia da fiscalização que a Receita Federal está fazendo sobre as declarações de Meirelles no ano de 2002. Também foi requisitado o relatório do BC sobre a investigação de remessas de recursos para o exterior, no total de R$ 1,37 bilhão, realizadas pela Boston Comercial Participações Ltda., por intermédio do BankBoston, quando Meirelles era presidente mundial da instituição. Fonteles quer ainda que seja investigada uma estrutura de empresas localizadas no exterior que pertenceriam a Meirelles.

Em princípio, a Receita e o BC terão de fornecer os documentos que foram requisitados em 60 dias. É impossível prever quando a investigação terminará. Depois de receber os dados, Fonteles vai analisá-los e verificar se é preciso pedir novas diligências. Se concluir que há provas contra Meirelles, pode pedir a abertura de processo criminal no STF. Se entender que não há provas, proporá o arquivamento.