Título: 'A âncora cambial está de volta'
Autor: Nilson Brandão Junior, Carlos de Assis e Luciana X
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/05/2005, Economia, p. B3

O Banco Central está usando a queda do dólar como âncora para combater a inflação, na visão de alguns economistas. Isto explicaria porque o BC deixou o dólar cair abaixo de R$ 2,5 nas semanas recentes, enquanto que no início do ano interveio no mercado, seja comprando a moeda americana, seja fazendo swaps reversos (operação financeira cujo efeito no mercado é semelhante ao da compra), em cotações bem acima daquele nível. Segundo essa visão, diante da persistência das pressões inflacionárias, mesmo com a taxa Selic a 19,5%, poucas opções restariam ao BC, além da âncora cambial. "Não tenho dúvida de que o único instrumento do BC é, via taxa de juros, fazer com que o câmbio seja uma ancoragem para permitir para que haja uma convergência para próximo da meta de inflação, ao redor do 6%", diz Carlos Thadeu de Freitas, professor do Ibmec e ex-diretor do BC.

Segundo Márcio Garcia, professor da PUC-Rio, é difícil saber com certeza absoluta as motivações do BC, mas tudo indica que o efeito antiinflacionário do câmbio está sendo bem visto pelo banco. "Por definição, assim como a desvalorização é um sócio negativo no combate à inflação, a valorização tem um efeito positivo." Garcia acrescenta, porém, que o BC sempre pode alegar que parou de intervir no câmbio porque já atingiu um nível de reservas que considera satisfatório.

O economista Marco Bonomo, da Fundação Getúlio Vargas, no Rio, não vê uma ligação tão nítida entre o fato de BC deixar o real se valorizar e o combate à inflação. "Obviamente, o BC poderia comprar mais dólares, mas isto tem um custo muito alto." O custo é a diferença entre a Selic, que o governo paga para captar reais, e a rentabilidade muito baixa que as aplicações das reservas internacionais rendem.

Ontem, no Fórum Nacional, o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, foi explícito sobre o impacto do câmbio: "É um assunto da área econômica, que tem terrível reflexos; sobre os reflexos eu comento, sobre a maneira de atuar não me compete comentar."