Título: Ações contra o excesso no uso de álcool
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/05/2005, Vida &, p. A12

A Organização Mundial da Saúde (OMS) começa a debater os efeitos do álcool para a saúde da população e possíveis ações para regular o consumo excessivo. A partir de hoje em Genebra, a Assembléia Mundial da Saúde reúne 191 países e, entre os temas que debaterá, está a necessidade de estabelecer políticas para reverter a situação preocupante gerada pelo consumo excessivo de bebidas alcoólicas. Por enquanto, os governos concordaram apenas em pedir que a agência de saúde da ONU inicie trabalhos para avaliar o impacto do álcool. Mas para muitos especialistas e para o próprio governo brasileiro, trata-se do primeiro passo para regulamentar o consumo e a venda de bebidas alcoólicas. O ministro da Saúde, Humberto Costa, que participará dos debates desta semana na Suíça, antecipou ao Estado a informação de que ações serão tomadas pelo governo no combate ao uso nocivo de bebidas. Costa revelou que, até o final do ano, poderá anunciar a primeira política nacional de combate ao uso excessivo do álcool. Em julho, um primeiro esboço do plano será enviado ao presidente Lula para sua aprovação. "As medidas vão envolver questões de saúde, novos serviços à população, além do endurecimento no cumprimento das leis de acesso ao álcool por crianças e adolescentes", explicou o ministro.

Entre as medidas que poderão entrar no pacote está o aumento de impostos sobre o álcool. "Hoje, a cachaça no Brasil é mais barata que um litro de leite", afirmou Jarbas Barbosa, secretário de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde. Uma das propostas é que o recurso coletado com esse imposto seja repassado para programas de saúde.

A venda do álcool também poderá ser mais limitada. Uma das propostas estudadas é a proibição da comercialização de bebidas alcoólicas em lojas e postos de gasolina em estradas. Segundo o governo, 60% dos acidentes graves nas estradas são causados por consumo excessivo de bebidas. Seria ainda necessário passar uma lei regulamentando o uso do bafômetro pela polícia. O governo estuda limitar também a publicidade de bebidas consideradas mais fracas, como a cerveja.

PREOCUPAÇÃO DO MERCADO

Na OMS, Costa falará sobre essa questão em seu discurso que fará amanhã e ainda se reunirá com o Ministério da Saúde da Suécia, país que inicialmente sugeriu que o tema fosse tratado pela agência da ONU. De fato, depois de aprovar um acordo para controlar o tabaco e dar orientações sobre o consumo de açúcar, o uso nocivo do álcool passa a ser o novo foco da OMS. Mas o mero debate sobre o produto já deixa a indústria preocupada e a Ambev chegou a acompanhar os debates.

A preocupação do setor privado tem explicação. Em um documento preparatório para a reunião, a OMS alerta que "problemas de saúde publica associados com o consumo de álcool chegaram a proporções alarmantes". O texto que será submetido à aprovação dos países, e que promete causar polêmica, acusa o álcool de ser responsável por 4% das doenças no mundo e 3,2% das mortes por ano - 1,8 milhão de vítimas. O tabaco seria responsável por 4,1% das doenças.

Mas diante do lobby da indústria e da posição contrária de alguns governos, a OMS teve de enfraquecer sua proposta inicial de resolução e que continha sugestões concretas para reduzir o consumo de álcool. Pela nova resolução, será sugerido que medidas para avaliar o impacto do álcool na saúde da população sejam estudadas. Nem mesmo a idéia de uma limitação para a publicidade permanecerá na atual resolução.

AIDS

Além da questão do álcool, o Brasil ainda tentará usar a Assembléia Mundial da Saúde para obter apoio para sua política de combate à aids e de produção de remédios. Costa e seus assessores passarão os próximos três dias fazendo lobby para obter apoio político a suas iniciativas, entre elas a quebra de patentes e o fortalecimento da capacidade produtiva do País no campo de anti-retrovirais.

Em julho, o Brasil ainda assumirá por um ano a presidência do Conselho Executivo da Unaids, braço da ONU que cuida de programa de combate à aids. Não por acaso, o Costa se reunirá nesta semana com Peter Piot, diretor da Unaids. A idéia é obter de Piot seu apoio político para a manutenção do programa brasileiro.

O primeiro dia da Assembléia Mundial será marcado pelo discurso de Bill Gates, fundador da Microsoft e que tem dado volumosas contribuições para a ONU.