Título: São José proíbe pílula do dia seguinte
Autor: Simone Menocchi
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/05/2005, Vida&, p. A14

Agora é lei: está proibida a pílula do dia seguinte em São José dos Campos. A Câmara Municipal de São José, maior cidade do Vale do Paraíba, promulgou ontem a lei que impede que essa pílula - remédio contraceptivo tomado até 72 horas depois da relação sexual - seja distribuída na rede pública de saúde. A cidade é a única do País, segundo o Ministério da Saúde, que não segue a política nacional de saúde pública, instituída pelo governo federal. A polêmica se arrastou por 70 dias, desde quando o vereador Lino Bispo (PHS), eleito por comunidades da Igreja Católica, apresentou o projeto, argumentando que o medicamento é abortivo.

Foram dois meses de protestos de grupos dissidentes, amarrações políticas e pressão por parte dos padres e líderes da Igreja. O bispo de São José, d. Moacir Silva, ordenou que o assunto fosse divulgado nas missas e um abaixo-assinado pressionasse os vereadores a votar a favor do projeto.

"Ninguém se sentiu pressionado, o que houve foi uma ponderação. Há uma grande controvérsia entre médicos e cientistas, por isso, sou a favor da vida e contra a pílula", afirmou o presidente do Legislativo, Dilermando Dié (PSDB), que promulgou a lei ontem, mesmo diante de pareceres dos departamentos jurídicos da Câmara e da prefeitura que consideraram o projeto inconstitucional.

O prefeito Eduardo Cury (PSDB) vetou o projeto, mas teve sua decisão derrubada. Segundo o artigo 200 da Constituição, cabe à União decidir sobre a política de saúde pública. "A lei federal deve sobrepor a municipal e então o prefeito deveria seguir o que manda a lei federal", afirmou o advogado José Aristeo Neto, do Sindicato dos Metalúrgicos, entidade que encabeça o movimento contra a lei municipal.

AÇÕES

Até segunda-feira, o advogado vai propor uma ação judicial contra a prefeitura por não obedecer à lei federal e distribuir o medicamento. "A prefeitura não é obrigada a obedecer à lei municipal e sim à federal." A Assessoria de Imprensa de Cury informou que ele vai aguardar os 30 dias para a regulamentação da lei.

Outras ações judiciais a favor da pílula também serão protocoladas. O Sindicato dos Servidores Públicos Municipais vai protocolar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) para prevalecer o direito à pílula.

O Ministério Público Federal também investiga se a Igreja fez pressão sobre os vereadores e se o prefeito está omisso no cumprimento da política pública de saúde determinada pelo Ministério da Saúde. Ele aguarda a publicação da lei no Diário Oficial do Município para também mover uma ação e obrigar a prefeitura a distribuir as 1.080 cartelas do medicamento, que continuam guardadas na Secretaria Municipal de Saúde.

Na sessão da Câmara de ontem à noite o vereador Lino Bispo afirmou que a meta agora é levar o mesmo projeto à Câmara Federal. Ele será apresentado até a próxima semana à Mesa Diretora pela deputada federal Ângela Guadagnin (PT). "São José está sendo exemplo para outros municípios de outros Estados, como do Paraná e de Mato Grosso do Sul, que já nos procuraram." De acordo com Bispo, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) vai encabeçar uma luta para que a pílula do dia seguinte seja proibida no País. "O Ministério da Saúde está errado. A pílula é que é inconstitucional, porque é abortiva", afirmou Bispo.