Título: Há 1 mês de deixar o cargo, Fonteles ainda é temido
Autor: Mariângela Gallucci
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/05/2005, Nacional, p. A11

BRASÍLIA - A um mês e meio de deixar a chefia do Ministério Público Federal, o procurador-geral da República, Claudio Fonteles, está limpando sua mesa e provocando calafrios em integrantes do governo. Depois de pedir a abertura de inquéritos contra o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, e o ministro da Previdência Social, Romero Jucá, ele afirma que não há nada mais a temer. Mas a expectativa na Procuradoria é de que surpresas surjam até o final de seu mandato, marcado para 30 de junho.

Indicado para o cargo pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e especialista em direito penal, Fonteles concentrou no final de sua gestão as ações contra autoridades. No último mês ele pediu no Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de inquéritos contra Meirelles (por suspeita de sonegação, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e crime eleitoral), Jucá (por supostas irregularidades na aplicação de um financiamento bancário) e o deputado federal Jader Barbalho (por indícios de envolvimento com crime tributário). O deputado federal Luiz Antônio de Medeiros foi denunciado por supostos crimes de prevaricação e cárcere privado.

Até a Igreja Universal do Reino de Deus não foi poupada pelo procurador. Ele pediu a quebra do sigilo fiscal da instituição para investigar o suposto envolvimento com duas empresas sediadas em paraísos fiscais que teriam financiado a compra da TV Record do Rio de Janeiro e de outras emissoras.

No caso da Igreja Universal, o advogado Arthur Lavigne, responsável por sua defesa, considera que a quebra do sigilo fiscal da entidade é incabível, já que o processo que apura suspeita de crime de evasão de divisas e sonegação fiscal na compra da TV Rio, hoje Record, não investiga diretamente a igreja, e sim a operação de compra. "Essa semana eu fiz uma petição ao relator (Carlos Veloso), argumentando e explicando a jurisprudência, e estou aguardando a apreciação dele", disse Lavigne.

Fonteles também foi o responsável por colocar mais fogo na polêmica sobre o plantio de sementes de soja transgênicas. Ele protocolou no STF uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) questionando a legislação que permitiu o uso das sementes sem prévio estudo de impacto ambiental. Mesmo afirmando que não ocorrerão mais surpresas, o procurador estuda atualmente a Lei de Biossegurança e já sinalizou que poderá contestá-la. Na época em que a norma foi aprovada, ele comentou: "Não descarto uma Adin". O estilo de Fonteles contrasta com o de seu antecessor, Geraldo Brindeiro, que tinha o apelido de engavetador-geral da República. A começar pela permanência na chefia do Ministério Público Federal. Fonteles não quer ser reconduzido. Brindeiro foi reconduzido três vezes e ficou oito anos no cargo.

Ao contrário do atual procurador-geral, Brindeiro evitava entrar em polêmicas e por diversas vezes pediu o arquivamento de inquéritos contra autoridades. Um deles envolvia o senador Antonio Carlos Magalhães, suspeito de realizar escutas telefônicas irregulares. Então procurador-geral, Brindeiro manifestou-se pelo arquivamento do inquérito. Fonteles assumiu o cargo e queria reabrir as investigações, mas o STF não autorizou.