Título: O que o francês teme na Carta da UE
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Fonte: O Estado de São Paulo, 15/05/2005, Internacional, p. A7

Principalmente, ele teme que o texto da Constituição da União Européia não incorpore toda a visão que ele mesmo tem da Europa

TASHKENT - Os protestos contra o presidente usbeque, Islam Karimov, estenderam-se ontem para a cidade de Korasuv, perto da fronteira entre o Usbequistão e o Quirguistão, onde os manifestantes invadiram prédios do governo, queimaram veículos e entraram em confronto com a polícia. Korasuv fica 150 quilômetros a leste de Andijan, onde na sexta-feira soldados usbeques abriram fogo com tanques e armas automáticas contra mais de 4 mil pessoas que haviam invadido um edifício da administração local. Testemunhas disseram ontem que cerca de 300 cadáveres, entre eles os de várias mulheres, foram retirados de madrugada de Andijan em caminhões e em um ônibus pelas forças de segurança, que impediram parentes de recolhê-los.

O ativista pelos direitos humanos Saidzhajon Zainabitdinov, do grupo usbeque Apelo, afirmou por telefone à agência Reuters que 500 pessoas, incluindo manifestantes e militares, podem ter morrido - no incidente mais sangrento da história pós-soviética do Usbequistão.

O presidente Karimov, porém, falou apenas em 30 mortos - entre eles 9 policiais e 10 rebeldes - e acusou fundamentalistas islâmicos ligados ao proscrito grupo Hizb ut-Tahir (Partido da Libertação) pela violência. Em sua primeira declaração sobre a violenta repressão, Karimov negou ter dado ordens para que as forças do governo atirassem contra a multidão de manifestantes.

O grupo Hizb ut-Tahir rejeitou a acusação e atribuiu a violência a Karimov e "seu regime opressivo, que prendeu e torturou milhares de vítimas inocentes".

O governo do Usbequistão, o Estado mais populoso da Ásia Central, com 25,4 milhões de habitantes, é aliado da Rússia e dos EUA na luta contra o terrorismo. Alguns analistas acreditam que a revolta em Andijan pode ter o mesmo fim da rebelião ocorrida em março no vizinho Quirguistão, que provocou a queda do seu presidente, Askar Akayev.

A violência em Andijan começou quando manifestantes islâmicos atacaram uma prisão para libertar 23 empresários acusados de integrar uma seita islâmica ilegal. Durante a ação de resgate dos empresários, cujo julgamento havia começado na quinta-feira, os manifestantes libertaram cerca de 2 mil presos.

O Usbequistão fechou ontem sua fronteira com o Tajiquistão. Também estabeleceu novos postos de controle no norte, no Vale de Ferghana, onde fica Andijan. Pela manhã, cerca de 600 usbeques, muitos deles feridos, cruzaram à força a fronteira com o Quirguistão, fechada já na sexta-feira, mas milhares de pessoas ficaram bloqueadas na zona limítrofe.

Jornalistas que trabalham para órgãos estrangeiros, entre eles um correspondente da agência Reuters, deixaram Andijan ontem depois que as forças de segurança os detiveram brevemente e advertiram que não garantiriam sua segurança.

Os últimos rebeldes deixaram ontem o edifício da administração invadido, mas alguns confrontos eram travados nas imediações. Um porta-voz dos rebeldes advertiu que lutarão até a morte.

Durante o dia, as pessoas que conseguiram recuperar os corpos dos parentes mortos os enterravam às pressas em Andijan. "No meu bairro houve cinco enterros hoje", disse Ismail de 25 anos, dono de uma loja de alimentos.

A cidade amanheceu ontem em meio a um cenário de guerra. A maioria dos mortos foi atingida por disparos de metralhadoras instaladas em tanques. As ruas estavam repletas de cápsulas de projéteis deflagrados e poças de sangue.

As controladas tevê estatal e a mídia do país mantiveram silêncio e informaram apenas a versão oficial dos eventos. Mas na Rússia a tevê estatal mostrou as imagens de cinco ou seis corpos com marcas de tiros nas ruas e sendo colocados em caminhões.