Título: Lessa: Palocci não entende de economia
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/05/2005, Economia, p. B4

O ex-presidente do BNDES Carlos Lessa, crítico confesso da equipe econômica, afirmou ontem que o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, "não sabe nada de política econômica" e, por isso, aplica mecanicamente na economia um receituário ortodoxo compatível com as noções que aprendeu no seu curso de Medicina. "Cabeça de médico acha que a dor é o caminho para curar", disse Lessa, comparando o pensamento médico do ministro ao tratamento de choque dado à economia, com a elevação da taxa de juros para controlar a inflação. De acordo com Lessa, a política de juros operada pelo Banco Central é um "absurdo" e o presidente do BC, Henrique Meirelles, o "autor desse pesadelo". Os comentários foram feitos no final do depoimento do ex-presidente do BNDES à Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara dos deputados sobre os supostos casos de corrupção que ele teria verificado no banco. A menção ao ministro da Fazenda surgiu quando a imprensa questionou por que Lessa concentrava as críticas no presidente do BC se as metas de inflação eram fixadas pelo próprio governo.

"A política econômica é um samba de uma nota só. Ele (Palocci) só lê autores neoclássicos", disse Lessa, referindo-se aos pensadores que defendem a mínima interferência do Estado na economia, com ênfase no controle da inflação. E emendou: "Ler não quer dizer que entende". De acordo com Lessa, o governo adotou "uma política de estabilização que é uma camisa-de-força". Mas considerou verdadeira a preocupação do presidente Lula em buscar instrumentos alternativos aos juros para combater a inflação.

Nas palavras do ex-presidente do BNDES, o espetáculo do crescimento anunciado pelo presidente em meados de 2004 não passou de um "vôo de galinha". E provocou: "Onde está a recuperação da economia brasileira? Somos bem comportados e daqui a pouco o rating (classificação de risco) da Argentina, que fez uma moratória, está melhor do que o nosso."

No seu depoimento, Lessa negou que tenha sido o "alto funcionário" do BNDES que, segundo o presidente Lula, falou da corrupção no processo de privatização do governo Fernando Henrique. "O que eu disse é que havia encontrado um banco desviado de sua função e operações tecnicamente malfeitas", destacando os megaempréstimos ao grupo americano AES, que adquiriu a Eletropaulo e parte da Cia. de Energia de Minas Gerais (Cemig).

Em um ponto do depoimento, Lessa se vangloriou de ter conseguido bloquear no BNDES - por meio da compra de ações da Vale do Rio Doce - a ampliação do espaço societário de um grupo japonês na empresa, o que a tornaria binacional, e lamentou não ter conseguido o mesmo na AmBev. Quando a cervejaria brasileira trocou ações com a belga Interbrew, Lessa diz ter tentado interromper as linhas de empréstimo para a empresa. "Considero essa operação uma vergonha. Eu pessoalmente queria interromper o financiamento da AmBev, mas os advogados disseram que não podia. Não bebo mais Brahma e gostaria de financiar todos os concorrentes da Ambev."