Título: Decisão unânime, mas discutível
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/05/2005, Economia, p. B2

A decisão do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) de elevar o juro básico em 0,25 ponto porcentual - de 19,5% ao ano para 19,75% ao ano -, adotada por unanimidade, levou muitos analistas a novamente considerarem que o instituto da moeda está exagerando nas suas preocupações com a inflação. E, desta vez, diversos fatores se compõem para lhes dar boa dose de razão. Tudo indica que, ao contrário, já há motivos para interromper a seqüência de elevação dos juros iniciada em setembro de 2004, aliás, presentes desde abril e reforçados em maio. A rigor, os juros são o único instrumento de que o Banco Central (BC) dispõe para arrefecer a demanda e, por conseqüência, a pressão sobre os preços. Essa pressão, no entanto, parece estar cedendo naturalmente, sem necessidade de se agravarem custos privados e da dívida pública com nova alta dos juros.

A inflação no atacado está em desaceleração, como mostrou a segunda prévia de maio do IGP-M, um índice no qual os preços no atacado pesam 60%, que acusou deflação de 0,09%, seguindo-se à estabilidade de preços registrada por índice de metodologia semelhante, o IGP-DI.

É verdade que a inflação para o consumidor - na qual se baseiam as decisões do Copom - ainda é elevada e sua projeção supera, no caso do IPCA, o teto superior da meta de inflação de 2005, de 7%. Mas também os indicadores da inflação no varejo apontam para arrefecimento, caso do IPC-Fipe e do IPCA de maio, projetado em 0,55% pela consultoria Tendências. Além disso, sabe-se que a médio prazo a queda dos preços no atacado é repassada para o varejo - mecanismo em parte prejudicado, no Brasil, pelo peso dos reajustes de preços administrados por contratos (tarifas de energia, telefone, água, transporte, combustíveis), que vêm subindo acima da média.

No plano internacional, o recuo dos preços do petróleo em quase 5%, nos últimos 30 dias, reduziu também as incertezas.

Outro aspecto justificaria a interrupção da alta do juro básico - a valorização do real ante o dólar e a do dólar ante o euro. Entre 18 de abril e 18 de maio, o dólar valorizou-se 2,78% em relação ao euro, mas caiu 6,09% em relação ao real. Enquanto isso, a taxa Selic elevada atrai mais recursos externos.

Criticado dentro e fora do governo, resta saber se o BC continua elevando a Selic apenas como uma espécie de seguro para atrair mais recursos externos, temendo eventual deterioração do mercado internacional, que sempre afeta mais e, em primeiro lugar, os países emergentes.