Título: 'Querem pegar Lula', diz dono da Novadata
Autor: Vasconcelo Quadros
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/05/2005, Nacional, p. A5

O empresário Mauro Dutra, dono da Novadata, fornecedora de 22% dos computadores do governo federal, quebrou o silêncio. Sua empresa é citada pelo ex-diretor dos Correios Maurício Marinho no vídeo em que fala de corrupção na estatal. Mas Dutra avalia que seu envolvimento na crise seja justamente pela sua proximidade com o presidente Lula, de quem é amigo há mais de 20 anos. ¿Querem pegar o Lula! Só posso atribuir a isso o que está acontecendo¿, desabafa, em entrevista ao Estado. Dutra acha que a amizade com Lula é a explicação mais plausível para que seu nome tenha, de novo, entrado no noticiário. Garante que nunca tratou de negócios com o presidente ¿ ¿Ele jamais se proporia a isso¿ ¿ e desde a posse esteve apenas duas vezes com Lula, nas festas de fim de ano no Planalto, para desejar felicidades à família.

¿Fui amigo do Lula e espero voltar a ser depois que ele deixar de ser presidente... em 2011¿, afirma, otimista com a disputa presidencial de 2006. Ele explica que a circunstância de que seja presidente impede as conversas, que antes eram freqüentes, mas sente ¿orgulho¿ de ser seu amigo. E considera que as acusações de que estaria se favorecendo da situação são o preço da imagem da mídia sobre sua relação com Lula. Reclama que nem na ditadura foi tão patrulhado: ¿Não posso ser discriminado porque sou amigo do presidente.¿ O empresário contesta as declarações de Marinho e revela que estuda levá-lo à Justiça. ¿Sim, o faturamento da Novadata dobrou no governo Lula (de R$ 142,2 milhões para R$ 337 milhões). Mas no do Fernando Henrique se multiplicou quatro vezes. De 1999 a 2002, a Novadata saltou de um faturamento de R$ 40 milhões para R$ 170 milhões¿, conta.

Novas concorrências vencidas contra outras empresas para fornecer equipamentos à Caixa Econômica Federal e à Petrobrás, segundo ele, aumentaram o faturamento entre 2003 e 2004. Dutra garante que se o prefeito de São Paulo, José Serra (PSDB), tivesse vencido a eleição presidencial, sua empresa teria a mesma posição. E cita as vendas ao governo paulista, do tucano Geraldo Alckmin, para insistir que não há promiscuidade entre negócios, amizade e política.

Mas o maior cliente é mesmo o governo federal. Entre março de 2003 e março de 2005, representa 73,61% (R$ 284,5 milhões) das vendas a todo o setor governamental ¿ com Estados e municípios ¿ e 55,1% do total, incluindo área privada. Segundo Dutra, a Novadata, há 25 anos no mercado, se especializou em negócios com o setor público, não participa de concorrências em governos suspeitos e tem crescimento contínuo desde 1990. ¿A cada ano vendemos mais.¿ A novidade, diz, é justamente a busca de novos nichos na iniciativa privada.

Ao contrário do que diz Marinho, assegura ele, as vendas à ECT caíram: R$ 60,3 milhões em 2002 (último ano de FHC), R$ 10,3 milhões em 2003 e R$ 5 milhões no ano passado ou 1,49% do faturamento total. Também não é verdade, acrescenta Dutra, que vença todas as concorrências de que participa.

SURREALISTA Ele diz que quem ouvir atentamente a gravação de Marinho percebe que a Novadata é citada de propósito numa conversa com outro contexto. ¿Chega a ser surrealista. Será que as outras empresas que concorreram iriam ficar caladas ao saber que um amigo do presidente pagou propinas para se beneficiar?¿ Dutra afirma que até o escândalo vir a público ¿nem sabia da existência de Marinho¿ e a Novadata sempre entrou nas licitações dos Correios em igualdade com as outras empresas.

A Novadata tem duas pendências com os Correios. Uma é o pedido de reequilíbrio econômico-financeiro ¿ uma revisão nos preços ¿ de um contrato sobre venda de equipamentos entregues em 2002 para tentar receber cerca de R$ 5,5 milhões. A Novadata e a Positivo, parceira na venda, pedem o reajuste alegando que os insumos dos computadores eram importados e o valor do dólar subiu.

Na gestão FHC, segundo o dono da Novadata, dois pareceres técnicos foram favoráveis à proposta, mas a decisão acabou ficando para o governo Lula. Em março de 2003, uma nova comissão dos Correios considerou procedente o pedido, mas reduziu o valor reivindicado pela metade. Dutra não aceitou. ¿Estamos brigando e queremos receber.¿ Ele afirma que Marinho não participou de nenhuma das comissões formadas para analisar o caso.

Entre os cerca de 300 contratos da gestão de Marinho que a Controladoria-Geral da União e a sindicância dos Correios investigam, a outra pendência da Novadata é a proposta de repactuar preços de um lote de peças de informática de cerca de R$ 1 milhão. A direção dos Correios informa que não há suspeita de irregularidades, mas investiga o caso por ter ocorrido na gestão de Marinho.