Título: Cuidado ao usar a internet: o chefe pode estar olhando
Autor: Marina Faleiros
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/05/2005, Economia, p. B16

Usar o e-mail da empresa para fins pessoais - principalmente se o conteúdo for ofensivo ou pornográfico - pode ser o caminho mais rápido para uma demissão por justa causa. É o que indicou, esta semana, o Tribunal Superior do Trabalho, em decisão inédita que autoriza as empresas a rastrearem e lerem os e-mails corporativos de seus funcionários. A ação surgiu de uma disputa judicial do HSBC Seguros contra um funcionário, demitido por enviar pornografia com o e-mail da empresa. Fora do Brasil, outro caso famoso foi a demissão do presidente da Boeing, Harry Stonecipher, cujos e-mails foram interceptados também por terem conteúdo erótico. Para Luiz Wever, sócio diretor da Ray & Berntson Brasil, que recruta executivos, as pessoas devem manter um e-mail pessoal para se comunicar com amigos e fazer isto em casa, nos momentos de lazer. "A empresa não pode estar vinculada com qualquer informação que possa denegrir sua imagem", diz. Carlo Hauschil, diretor geral da Hewitt, consultoria de RH, afirma que os jovens são, principalmente, os que têm o hábito de utilizar internet de forma indevida no serviço. "É preciso verificar se tem algum tipo de assunto ou tema que extrapole para algo que prejudique a corporação", alerta.

Para evitar problemas como o do HSBC e da Boeing e aumentar o foco no trabalho, é que Rodrigo Pimenta, diretor executivo da Madis Rodbel, fabricante de pontos eletrônicos, decidiu bloquear a abertura de alguns tipos de arquivos e impediu a entrada em sites com palavras restritas, além de sites de e-mails, Orkut e uso de MSN, programa de mensagens instantâneas da Microsoft. "Envolvi os funcionários num trabalho conjunto e chegamos à conclusão de que deveríamos ter um controle para que os funcionários tivessem maior produtividade", conta. Segundo Pimenta, algumas pessoas chegavam a perder 30% do seu dia de trabalho com distrações do meio eletrônico. Agora, o acesso livre é permitido apenas depois do expediente.

Na Clássico Consultoria Contábil, o sócio Nivaldo Cleto leva a sério a questão do foco no trabalho e chega a incluir na lista de sites proibidos mais de 20 endereços por semana. "A internet é algo que fascina muito e comecei a perceber que as pessoas navegavam em sites com conteúdo totalmente fora da área de trabalho e no e-mail pessoal, às vezes, gastavam de três a quatro minutos por mensagem. Vi que perdia dinheiro e produtividade".

As empresas, diz Paulo Kretly, gerente geral da Franklyn Covey Brasil, mais do que nunca querem funcionários que mostrem resultados. "Se a pessoa não tiver capacidade de decidir quando e que tipo de comunicação usar, se distrai e cai num ciclo de improdutividade". Hauschil também considera a seleção essencial: "Quanto mais meios de comunicação temos, mais fácil e mais poluída ficam as informações, o que impõe uma capacidade seletiva maior", diz.

Já Marcos Hashimoto, professor da Business School São Paulo na área de desenvolvimento organizacional, defende que as empresas devem, sim, liberar a internet e estabelecer uma relação de confiança com o funcionário, o que, por si só, minimizaria o uso da internet para fins pessoais. "Muitas vezes as idéias são inovadoras porque os funcionários têm contatos pessoais com o mundo exterior". Para ele, proibir o livre acesso é nivelar funcionários por baixo. "É difícil estabelecer como a criatividade surge, mas quando a pessoa tem variedade de experiências e se desconecta da situação, é que uma idéia aparece", diz. Hashimoto, no entanto, afirma que não há mal nenhum a companhia alertar um funcionário, caso ele faça uso indevido, por exemplo, do e-mail corporativo. "Mas elas precisam usar de forma madura ferramentas para vasculhar e-mails, como rastrear algumas palavras, porque senão também acaba virando uma caça às bruxas", afirma.