Título: Campo banca só 10% dos benefícios rurais
Autor: Luciana Nunes Leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/05/2005, Nacional, p. A4

RIO - Na pequena cidade gaúcha de Barros Cassal, a 250 quilômetros de Porto Alegre, o período de setembro a março é de oferta de emprego. Boa parte dos 13 mil habitantes vai para a lavoura de fumo. Em abril, colheita encerrada, começa a escassez de trabalho. Com o desemprego de novo em alta, quem tem renda mensal garantida são os aposentados. "Nessa época, se a gente tirar os idosos da cidade, o comércio enfraquece muito", admite o secretário municipal de Agricultura, Edson Moraes Zinn. Barros Cassal repete o dilema de mais de 3 mil municípios brasileiros onde as aposentadorias e outros benefícios do INSS são os motores das economias. Estudo com base em dados de 2003, feito pelo auditor fiscal da Previdência Álvaro Solon de França, mostra que em 68% das cidades brasileiras os benefícios do INSS superam a receita do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) - recursos da União repassados às prefeituras (um ano antes, o porcentual era de 63,8%).

ALÍVIO

Os comerciantes respiram aliviados na primeira semana do mês, quando o INSS paga os benefícios e as vendas decolam. Nesses pequenos municípios, a maior parte dos benefícios é de aposentadorias rurais, concedidas desde 1988 a trabalhadores que, na grande maioria, nunca contribuíram para a Previdência. "No País onde renda é cidadania, as aposentadorias servem de argamassa para a coesão familiar. Esse fenômeno alcança cidades de até 30 mil habitantes", diz Solon.

Se ajudou a reduzir a pobreza, a aposentadoria rural contribuiu fortemente para o desequilíbrio previdenciário. A contribuição hoje do campo é de apenas 10% do que se gasta com benefícios rurais. A renda, no entanto, é indispensável para os 7,2 milhões de aposentados e pensionistas que a recebem.

A pesquisa mostra também que é crescente o peso dos benefícios previdenciários no Produto Interno Bruto (PIB). O total de benefícios do INSS em 2002 representou 6,7% do PIB nacional; em 2003 chegou a 7,2%. No Piauí, um dos Estados mais pobres do País, as aposentadorias, pensões e auxílios alcançam 17,2% do PIB estadual; no Maranhão, 15,2%.

"Importante não, importantíssimo", diz o secretário de Finanças de Afogados da Ingazeira (PE), Paulo Valadares, quando fala do peso das aposentadorias na economia local. "A aposentadoria é mais importante que o emprego", arremata. Em 2003 o repasse da União à prefeitura foi de R$ 5 milhões e os benefícios previdenciários alcançaram R$ 21 milhões. Em Pernambuco, quase 9 em cada 10 cidades repetem o cenário.

"A gente vê de cara quando é dia de pagamento de aposentadoria. A cidade fica cheia de gente, de carro. E ainda tem o pessoal que vem de duas outras cidades onde não tem posto de pagamento do INSS", diz José Raimundo da Costa, secretário de Finanças de São Bernardo (MA), a 480 quilômetros de São Luís, que está entre os cem municípios com pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do País.

"Aqui a população tem duas fontes de renda: a aposentadoria do INSS ou a aposentadoria dos funcionários públicos", conta o secretário. Para jovens e adultos, resta o emprego informal no campo para trabalhadores de hoje que serão os aposentados rurais do futuro.