Título: 'Não' ganha força na França e põe UE em alerta
Autor: Reali Júnior
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/05/2005, Internacional, p. A22

Os defensores do "sim" no referendo francês do dia 29 sobre a Constituição européia não conseguem esconder uma crescente preocupação, diante da perspectiva de um resultado desfavorável. O resultado dessa consulta popular poderá comprometer o projeto constitucional europeu. Isso porque a Carta só pode ser adotada por consenso, isto é, pelo conjunto dos 25 países da União Européia. Até agora oito países, entre eles Espanha e Alemanha, já ratificaram o texto.

Ontem, uma nova pesquisa do instituto BVA, publicada pelo semanário L'Express indicava a vitória do "não" sobre o "sim" por 53% a 47%. A média do conjunto das pesquisas divulgadas durante toda a semana confirma a tendência por 52 % a 48%.

Os observadores começam a admitir a consolidação desses números e poucos são os que acreditam numa reversão. Os partidários do não, políticos como Jean- Marie Le Pen, presidente da Frente Nacional. de extrema direita, e Jean-Pierre Chevénement, ex-aliado dos socialistas, estão comemorando antecipadamente a vitória. Ontem, empregando um tom fortemente irônico, Chevénement agradeceu a ajuda dos defensores do "sim", citando o presidente Jacques Chirac, o primeiro-ministro Jean-Pierre Raffarin, Jack Lang, Lionel Jospin, François Holande, além de alguns dirigentes europeus - entre eles o chanceler alemão, Gerhard Schroeder, e o primeiro-ministro espanhol, José Luis Zapatero. Até agora, entretanto, a chamada "batalha pela dramatização" do referendo parece também perdida.

Toda a tentativa de mobilização do grupo governamental está sendo anulada pelo alto índice de impopularidade de Chirac e de Raffarin, cuja substituição poderá ocorrer após a votação.

A única chance dos partidários da Constituição é equilibrar a disputa tentando convencer os indecisos, 17%, a pouco mais de uma semana do referendo, fato que não permite ainda apontar com absoluta certeza um vencedor.

Esses eleitores indecisos estão entre os quase 60% dos franceses que se manifestam pessimistas em relação ao futuro da França e da Europa.

Os franceses estão tomando posição nesse referendo levando em conta o contexto de uma democracia nacional e não o de uma democracia européia.

Outra constatação nessa campanha tem sido o antagonismo entre as palavras liberal e social. O projeto de Constituição foi sempre denunciado como ultraliberal pelos defensores do "não". Eles vêem nele perigos para a soberania nacional e o setor social e ausência de regras nos mercados de trabalho e na economia.

O medo da concorrência dos trabalhadores de Portugal, Polônia ou República Checa - empresas desses países passam a circular livremente por todo continente, aplicando sua legislação nacional, salários mais baixos e tempo de trabalho mais elevado - é um outro aspecto que preocupa os sindicatos da França, um país que trabalha 35 horas por semana e cuja legislação social é bem mais protetora.