Título: Da disputa por mogno à guerra pelo poder em RO
Autor: Luiz Maklouf Carvalho
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/05/2005, Nacional, p. A11

Nos anos 80/90, o hoje governador de Rondônia, Ivo Narciso Cassol (PSDB), embrenhava-se nas matas à procura dos melhores mognos, que ele mesmo derrubava. Um dia, um de seus mateiros cortou gravemente a mão. "Cassol muniu-se da agulha e linha usadas para remendar as roupas no meio do mato, desinfetou o corte com aguardente, costurou a ferida e salvou a mão do mateiro." As aventuras do Cassol desmatador de mogno estão no site oficial do governo que ele comanda desde 2003. Hoje, quando o mogno que enriqueceu os desbravadores da fronteira rondoniense vai se acabando, Cassol vive a maior crise de seu governo. Bombardeado por denúncias que estão sendo apuradas pelo Superior Tribunal de Justiça, Ministério Público Federal e estadual e Assembléia Legislativa do Estado - com a qual está em guerra declarada desde que deu a público, através do Fantástico, da TV Globo, as gravações de vídeo em que sete deputados lhe pediam propina -, o governador luta para não cair.

Sua principal arma pública é o jornal Folha de Rondônia. Não é oficialmente dele, mas é como se fosse. Nessa área do jornalismo e da publicidade, o governador delegou responsabilidades a um de seus homens-chave: Jari Luiz, dono da NDA Publicidade, detentora da conta do governo estadual. Os outros dois são Expedito Junior e Amadeu Guilherme Matzembacher Machado, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado.

Expedito, ex-deputado federal, era o dono oficial do jornal, vendido recentemente. Embora não tenha vínculo formal com a principal empresa de segurança contratada pelo governo, a Condor Segurança e Vigilância, acompanha com muito interesse o seu desempenho. A Condor é um dos alvos de investigação na Assembléia.

Para entender a crise rondoniense de agora, há que voltar aos tempos do mogno. Os Cassol e os Oliveira (da família de Carlão de Oliveira, presidente da Assembléia) instalaram-se na mesma região de fronteira - a chamada zona da mata de Rondônia, onde destaca-se o município de Rolim de Moura. Cada família construiu o seu império, de terras e bois.

Os atritos radicalizaram-se na região quando Cassol foi duas vezes eleito prefeito de Rolim de Moura (97-2000, 2001-2002). Na ação penal que tramita no STJ, a denúncia do Ministério Público Federal acusa Cassol de, quando prefeito, ter cometido crimes previstos na Lei de Licitações Públicas. Também são réus Aníbal de Jesus Rodrigues, contador do Grupo Cassol, Nilton Soares dos Santos, Izalino, Ivalino e Ilva Mazzono, Josué Crisóstomo, Erodi Matt e Salomão da Silveira, todos ligados a empresas supostamente beneficiadas pela prefeitura.

Os Mazzono são parentes da esposa de Cassol. Em entrevista ao Estado, o deputado estadual Nereu Kosinski (PT) acusou Aníbal Rodrigues, o contador do grupo empresarial do governador, de ser "o PC Farias de Cassol" e sócio de empreiteiras que "vencem mais de 50% das licitações para execução de obras no governo".

Kosinski foi um dos integrantes da comissão da Assembléia que investigou acusações de irregularidades na Secretaria Estadual de Educação (Seduc). Uma delas é a compra, pela Seduc, de 1.000 fotografias de Cassol por R$ 75 mil. Outra irregularidade foi o gasto de R$ 858.672,80 com passagens aéreas. Apenas 12,22% dos vôos fretados pelo governo foram realizados, 42,22% deles em fins de semana. A comissão também afirma que em 2004 o governo gastou R$ 15 milhões com vigilância, pagos a uma única empresa. Há suspeita de superfaturamento e não cumprimento do serviço.

O relatório sobre as irregularidades na Seduc está assinado por sete deputados, entre eles, dois que foram gravados pedindo propina, Ellen Ruth e Amarildo Almeida. Quem vai dar o parecer sobre a cassação ou não de seus mandatos é o deputado Edésio Martelli (PT), ainda pasmo pelos colegas terem caído na armadilha de Cassol.