Título: Para AIEA, Chávez só quer provocar EUA
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/05/2005, Internacional, p. A12

Altas fontes na Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) consideram as declarações do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, sobre seus objetivos de lançar um projeto nuclear em cooperação com o Irã ou com o Brasil como "mais uma tentativa de irritar os EUA". No domingo, em seu programa de rádio, Chávez afirmou que poderia lançar tal projeto e chegou a citar o desejo de uma cooperação com o Brasil. Oficialmente, a AIEA preferiu não comentar as declarações, mas analistas deixaram claro que o tema é sensível. "Não é comum escutar alguém dizendo que está lançando um novo programa nuclear, principalmente com o Irã", afirmou um alto funcionário da AIEA com sede em Viena. A agência esclarece que todos os países "têm o direito soberano de estabelecer acordo nucleares para fins pacíficos com qualquer outro governo". De fato, a agência não precisaria dar seu aval a acordos, mas eles somente poderiam ser fechados entre países que respeitam as salvaguardas impostas pela AIEA. Além disso, qualquer importação de urânio e de tecnologia teria de ser comunicada à agência. Segundo funcionários da agência, a polêmica em torno das declarações de Chávez não está relacionada com sua menção ao Brasil, mas com o fato de ter indicado o Irã como eventual parceiro. "Desconhecemos a existência de um acordo de cooperação assinado por Teerã nos últimos anos. Normalmente, quando se busca um acordo de cooperação, a idéia é obtê-lo de um país com uma tecnologia que possa ser útil. No caso do Irã, pelo que sabemos, a tecnologia desenvolvida até agora não traria nenhum benefício aos venezuelanos", afirmou a fonte. O Irã é criticado por alguns governos, segundo os quais Teerã estaria tentando desenvolver um programa de armas nucleares. A AIEA admite que até 2003 Teerã violou uma série de regras ao não declarar suas atividades, mas tal comportamento teria sido revisto desde então.

Quanto à menção ao Brasil e à Argentina feita por Chávez, analistas de Viena acham que um eventual acordo teria de passar pela Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares (ABACC). A AIEA vê a instituição como uma aliada na região. Se mais algum país na América do Sul desenvolver capacidade nuclear, a agência da ONU gostaria que esse país fosse incluído na ABACC. Como a Venezuela é signatária do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, Chávez teria de pedir autorização à AIEA na eventualidade de construir uma instalação nuclear.

A oposição venezuelana acusou ontem Chávez de fazer declarações polêmicas para desviar a atenção do fracasso da política petrolífera do governo. Além de falar do programa nuclear, Chávez ameaçou romper relações com os EUA se Washington não extraditar o anticastrista Luis Posada Carriles.