Título: Nas empresas familiares, o desafio de chegar à 4.ª geração
Autor: Marina Faleiros
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/05/2005, Economia, p. B14

O francês Olivier de Richoufftz esteve esta semana, pela primeira no Brasil, para divulgar o trabalho da Family Business Network (FBN), associação internacional que discute temas relacionados a empresas familiares em mais de 60 países. Em sua passagem pelo País, ele destacou o momento delicado que a maior parte dos negócios familiares brasileiros estão vivendo: a transição da terceira para a quarta geração de herdeiros. De acordo com ele, 30% das empresas deixam os problemas de sucessão para a segunda geração e, do restante, apenas 15% se estruturam para a chegada da quarta geração. "É até esta quarta linhagem que as empresas geralmente precisam tomar decisões delicadas, como buscar dinheiro no mercado, renovar o capital, mudar o foco da empresa ou até mesmo fazer uma compra entre acionistas da família", diz.

Isto acontece, explica, porque os primeiros herdeiros têm um contato direto com os fundadores, vivem a criação do negócio de perto e compartilham os mesmos valores. "Já com os herdeiros seguintes não há mais a proximidade com os criadores e as estratégias passam a ser definidas com irmãos, tios e primos, que podem ter perspectivas diferentes".

Patrice Gaidzinski, diretora executiva da FBN no Brasil e conselheira da Eliane, empresa fabricante de cerâmica da qual é herdeira, cita que de todas as empresas familiares, apenas dois terços passam para a terceira geração e, das que sobraram, só 15% seguem adiante. " Muitas vezes a opção é vender o negócio. Mas nas empresas que passam da terceira leva de herdeiros, geralmente o negócio já é um sucesso", diz.

Para manter a companhia em família, Richoufftz defende a definição o quanto antes as estratégias de sucessão e poder. Ele conta que a idéia do FBN é justamente trabalhar as diferentes estratégias de escolha, e um dos principais pontos a serem trabalhados é a educação dos descendentes. Aí também é que entra, diz, um importante detalhe: ser dono da empresa não quer dizer, necessariamente, que a pessoa precise trabalhar como executiva do negócio. "E se o herdeiro ainda quiser se manter no negócio, precisa conhecer muito bem a estrutura da sua empresa para poder fazer parte de um conselho, no qual se tomam as decisões", completa Patrice.

Neste trabalho com as próximas gerações, o FBN promove um programa diferente de intercâmbio de jovens herdeiros no mundo todo. No Brasil, cinco jovens já fizeram estágios em empresas familiares de outros países e moraram com as famílias proprietárias para sentirem de perto as dificuldades de outras companhias e conhecerem projetos diferentes dos da sua família. Jorge Gaidzinski Cordeiro, um dos herdeiros da Eliane, foi para a Finlândia. "O objetivo é criar esta identidade de pertencer a uma empresa familiar e compreender a real competência de seu lugar e a importância da profissionalização. Não é a questão de ter que trabalhar na empresa ou não, mas de ser um acionista responsável", afirma Patrice.

Na sua passagem pelo Brasil, Richoufftz ainda tocou em um ponto polêmico, ao defender que o presidente deste tipo de empresa não seja membro da família. "É difícil quando uma pessoa é acionista, membro da família e ainda tem que dirigir o negócio. Ele tem que lidar com contradições no dia-a-dia e poderia haver uma dificuldade para sua sucessão".

Na Eliane, por exemplo, este conselho já é seguido e o presidente não é herdeiro. O controle acionário está divido entre 16 familiares. "Nossos executivos são profissionalizados e contamos com executivos de fora da família. Também no conselho temos representantes dos familiares e conselheiros independentes". Ela ainda conta que a empresa possui um conselho de familiares, para o debate de questões envolvendo os parentes. Para trabalhar na empresa, um parente também precisa ser formado e ter experiência. "Ele concorre como qualquer outro".