Título: Derrota do 'sim' terá efeitos fora da Europa
Autor: Reali Júnior
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/05/2005, Internacional, p. A11

No debate sobre a Constituição européia, o foco está normalmente no impacto que o referendo pode ter sobre a França e o futuro desenvolvimento da União Européia (UE). Um voto pelo 'não' provavelmente deixaria a França num estado de rebaixamento. Por mais de meio século, a influência francesa esteve intimamente ligada ao papel de Paris no processo de integração européia.

Assim, ao adiar a integração européia com um voto pelo 'não', a França perderia um de seus principais recursos como grande ator no cenário internacional.

Uma atenção muito menor tem sido dedicada aos substanciais efeitos do 'não' sobre os parceiros e questões fora do âmbito da UE. A conseqüência mais óbvia seria o longo período de introspecção institucional e política que a UE teria. Com isso, os parceiros da Europa não poderiam mais contar com o mesmo grau de compromisso europeu.

Esta seria uma má notícia para os empreendimentos dependentes do apoio europeu, como o processo de paz no Oriente Médio e as ações ocidentais para limitar a proliferação de armas de destruição em massa.

Os esforços para se evitar ou limitar o conflito violento na África seriam particularmente afetados, dado o papel essencial da Europa nessa questão.

Uma Europa desengajada e voltada para si mesma não seria muito útil num mundo onde os EUA carecem de amigos de peso econômico e político similar. É nos Bálcãs que o 'não' poderia ter conseqüências extraordinariamente maléficas. A perspectiva do ingresso na UE no longo prazo é o trunfo mais poderoso à disposição dos europeus para promover a transformação política e econômica de sociedades que ainda trazem as cicatrizes das guerras e disputas civis dos anos 90.