Título: Crise pode chegar aos vizinhos
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/05/2005, Internacional, p. A11

A crise política na Bolívia poderia ter um forte impacto em toda a América do Sul, causando turbulências entre os indígenas e nas áreas energética, eleitoral e até de fronteiras. A afirmação é do analista político argentino Rosendo Fraga, diretor do Centro de Estudos Nueva Mayoría. O analista sustenta que a recente queda do presidente equatoriano Lucio Gutiérrez confirmou que atualmente, na América Latina, quando um presidente perde o controle dos protestos violentos nas ruas, pode perder o poder. E esse é o risco que corre o presidente Carlos Mesa na Bolívia, agravado pelo foco secessionista na região oriental. Fraga destaca que a Bolívia, "o país mais pobre da América do Sul", é - depois do Brasil - o que tem mais fronteiras na região (com a Argentina, Paraguai, Brasil, Peru e Chile) e por isso, uma mudança em seu regime teria um impacto muito maior que o provocado pela crise do Equador ou a crise da Argentina em 2001. Os EUA apóiam Mesa e querem evitar uma crise na Bolívia, mas não dão ao assunto prioridade suficiente para impedi-la, diz Fraga.

O analista sustenta que "os países com a problemática indígena são os primeiros que poderiam sofrer os efeitos da crise boliviana. As etnias aimará e quéchua são dois terços da população da Bolívia e dominam os cinco departamentos (Estados) da região ocidental. O Peru e o Equador são os dois outros países sul-americanos com maior população indígena, que coincidentemente, vivem abaixo da linha de pobreza.

Por este motivo, afirma, Fraga, "uma crise na Bolívia pode estender-se ao Peru e pode complicar a situação no Equador, cujo novo governo é frágil e contraditório, apesar de sua popularidade inicial.

Além destes cenários, a crise na Bolívia também causaria problemas com o Chile, já que nos últimos meses, ressurgiu a reivindicação boliviana do acesso para o mar que perdeu na Guerra do Pacífico (1879-83).

A Argentina também sofreria os efeitos da crise, já que seu abastecimento de energia, desde o ano passado, depende do gás boliviano. Sem este produto, a Argentina poderia passar por uma nova crise de abastecimento, que esfriaria a recuperação da economia, além de complicar as chances do presidente Kirchner de obter uma retumbante vitória nas decisivas eleições parlamentares de outubro deste ano. Por tabela, afirma Fraga, o Chile tambem teria problemas energéticos, já que importa gás da Argentina.