Título: Benéfico e sem contra-indicação, chá deve ser um hábito de prazer
Autor: Simone Iwasso
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/05/2005, Vida &, p. A14

Maçã, canela, amêndoas, hibisco e rosa mosqueta. Pêra, nata e camomila. Chá verde com pétalas de girassol e flores azuis. Morango com essência de baunilha. As combinações são inúmeras, assim como os aromas, dos mais variados. Basta ter água fervente e xícaras ou canecas para descobrir que, muito mais do que uma bebida associada a gripes e resfriados, o chá é um hábito ligado ao prazer e ao conforto, principalmente nos dias em que a temperatura começa a diminuir e o corpo pede por algo que aqueça - e que, além disso, seja benéfico e não tenha contra-indicações. Da cerimônia do chá no Japão, repleta de regras e simbologias seculares, ao chá da tarde inglês, costume criado pela monarquia do país, a infusão de ervas em água quente ganhou durante o tempo rituais e regras próprias, de acordo com o local e a época em que foi difundido. No Brasil, apesar de ainda ser visto por muitos como aquela bebida que as avós preparavam quando alguém estava doente, o chá já ganhou adeptos fiéis, exigentes e que se abastecem em lojas e empórios com produtos sofisticados, que proporcionam combinações inusitadas e requintadas para estimular todos os tipos de paladares.

É um mundo novo para quem está habituado apenas ao café com leite ou, no máximo, ao chazinho de camomila ou hortelã. Os apaixonados pela bebida sabem diferenciar as folhas usadas, o local onde foram plantadas, o modo como foram colhidas e armazenadas e até mesmo o tipo de papel usado nos sachês, se com ou sem cloro - variáveis que influenciam no aroma e no paladar da bebida servida.

Mas não são detalhes para assustar ou inibir os mais leigos. "Cada chá tem um tempo certo de infusão e uma temperatura apropriada. Mas não é preciso saber de todos esses detalhes para beber um chá. Deve-se somente escolher bem antes de comprar. Cheirar para ver se não tem cheiro de mofo, olhar as folhas para ver se não estão velhas e ler a embalagem do produto para saber o que tem na mistura. Para isso, ninguém precisa ser expert em chá", diz Carla Saueressig, uma das poucas especialistas em chá do País, proprietária da loja Tee Gschuendner, localizada nos Shoppings Higienópolis, Iguatemi e Villa-Lobos, em São Paulo. No local, além de vender produtos sem agrotóxicos e importados da Alemanha, as vendedoras ensinam a preparar os vários tipos de chá.

AÇÚCAR?

Observações que devem ajudar a pessoa a aproveitar o produto em vez de desestimulá-la. "Por exemplo, me perguntam muito se pode ou não adoçar o chá. Digo que depende do gosto de cada um. Se a pessoa gosta, não tem problema colocar açúcar ou mel. Não é errado. É um hábito cultural", explica Carla. "Gosto de falar que beber chá é um prazer. É um ritual de cada pessoa. O momento que ela tira para fazer uma pausa, ferver a água e aproveitar a bebida, em casa ou no trabalho", conta.

No entanto, para os muito preciosistas, até para as denominações existem regras. Teoricamente, apenas a bebida produzida com a planta Camellia sinensis, que dá origem ao chá verde e preto, podem ser chamadas de chá. As feitas com ervas e frutas seriam infusões de ervas. "Existem mesmo algumas regras, mas elas estão aí para serem quebradas. Chá ainda é uma coisa muito nova no Brasil ", diz Carla.

Para quem gosta, não importa o nome. O divertido e prazeroso é combinar sementes, flores e ervas num resultado agradável ao olfato e ao paladar. "Costumo comprar misturas prontas e também tenho várias receitas que faço em casa e ensino aos meus alunos. Mas a minha preferida eu mesma faço, misturando gengibre cru, cabeças de cravo, pauzinhos de canela e sementes. Coloco num bule com os ingredientes e água fervente. Depois, vou completando a mistura durante o dia com água", conta a professora de ioga Márcia de Lucca.

"Faz parte de um hábito antigo. Gosto de tomar chá todos os dias, um pouco de cada vez, e costumo servir para as pessoas, os amigos, os meus alunos. Recepciono com chá e não com café. Além de ser gostoso, faz bem para a digestão, ajuda a limpar o organismo", afirma.

HÁBITO SAUDÁVEL

A professora não está errada. Além de ser gostoso e agradável, o chá pode ter efeitos benéficos para o corpo. "O chá deixa a pessoa aquecida, não tem calorias, apenas o composto, e pode ser bebido várias vezes durante o dia", afirma a nutricionista Daniela Silveira, pesquisadora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

O chá verde, popular entre os orientais, é um dos mais lembrados quando se trata de benefícios. De acordo com vários estudos, tem substâncias que auxiliam no processo digestivo, além de ser um estimulante mental - poder descoberto há séculos pelos monges budistas que ingeriam a bebida para se manterem despertos nos retiros para meditação.

Já o chá preto e o chá mate pedem alguns cuidados, principalmente para quem tem problema de gastrite. "Assim como o café, eles têm compostos fenólicos que impedem a absorção de nutrientes, principalmente o ferro, se ingeridos logo após as refeições. O ideal é esperar duas horas depois de comer e então beber o chá", explica Daniela. Além disso, esses compostos estimulam a produção de ácido clorídrico pelo estômago, substância que provoca ainda mais irritação em quem já tem gastrite ou úlcera.

Para essas pessoas, o ideal são as infusões com ervas, como camomila, erva-cidreira, capim-limão, hortelã ou frutas, misturadas com as mais variadas essências. "Pesquisas mostram que o gengibre é benéfico para náuseas e vômitos. A hortelã ajuda na digestão, o chá verde também é bom. Mas o gostoso é tomar chá não porque faz bem, mas porque a pessoa gosta. Por prazer."