Título: Sucessão de CPIs pode transformar Congresso em palanque antecipado
Autor: Denise Madueño, Christiane Samarco
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/05/2005, Nacional, p. A4

A entrada em funcionamento de sucessivas Comissões Parlamentares de Inquérito no Congresso - algumas contra o governo Luiz Inácio Lula da Silva, outras contra o governo Fernando Henrique Cardoso - promete aquecer, quase no início do inverno, a temporada pré-eleitoral, numa escalada que já preocupa o governo e, em menor medida, a oposição. Se a moda pega, a guerra das CPIs pode, de fato, dar munição a alguns partidos para a disputa eleitoral de 2006 e transformar outros em vidraça. Entre os temas que estão na mira das investigações parlamentares, figuram o caso de corrupção nos Correios, o escândalo Waldomiro Diniz - até agora imune às investigações - e as suspeitas de irregularidades durante o processo de privatização no governo FHC. "A situação ficará incontrolável se as CPIs se tornarem uma luta entre governo passado e o atual, entre oposição e governo", avalia o líder do PT na Câmara, Paulo Rocha (PA), que ainda diz que o País vive um momento de retomada do desenvolvimento e um processo político que não deve ser tumultuado justamente nessa hora.

INCÔMODO

Ao mesmo tempo em que trabalham para controlar a CPI dos Correios, os governistas se preparam para atuar na comissão de inquérito da Câmara que vai investigar a privatização do setor elétrico - um tema que provoca desconforto a PSDB e PFL, mas também incomoda o governo. Um acordo entre os líderes partidários e o presidente da Câmara, Severino Cavalcante (PP-PE), fixou a instalação da CPI do Setor Elétrico para esta semana. Ela já deveria estar funcionando desde o ano passado, mas a falta de interesse dos partidos governistas e da oposição atrasou seu início.

A enxurrada de CPIs vai realmente paralisar o Congresso e prejudicar o governo, crê o líder do PP na Câmara, José Janene (PR). "Não adianta o ministro Antonio Palocci negar. A instabilidade política é prejudicial aos investimentos em qualquer setor", justifica. Aliado do Planalto, Janene aponta a CPI do Setor Elétrico como potencialmente mais nefasta ao governo do que a CPI dos Correios. Para ele, "queira ou não" a CPI vai afastar investimentos, o que já está produzindo mal-estar em todos os partidos.

ESTRAGO

O líder do PSDB, Alberto Goldman (SP), afirma que seu partido não teme investigações sobre o governo FHC, mas argumenta que a CPI do Setor Elétrico provocará mais estragos para a administração petista, pois é previsível que vá injetar desconfiança nos investidores. "O governo é que terá problemas, não só no setor elétrico, mas em todas as áreas", disse.

Em primeiro lugar na fila ficou a CPI que trata dos contratos da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), outra Comissão que pode criar enormes problemas para o governo. E o mais grave é que essa CPI foi patrocinada por um aliado do Planalto, o deputado Daniel Almeida (PC do B-BA). Como no caso da CPI do Setor Elétrico, o ruído produzido pela investigação pode tornar o ambiente desestimulante para investidores da área. O ministro Palocci tentou, sem êxito, demover Almeida. "As empresas não vão deixar de fazer investimentos por causa da apuração", garante o deputado.

ACIRRAMENTO

O líder do PSB na Câmara, Renato Casagrande (ES), acha que será difícil evitar que as CPIs acirrem o confronto entre governo e oposição. E chega a prever uma crise institucional se os partidos não mantiverem o equilíbrio. "Imagine quatro CPIs funcionando ao mesmo tempo dentro do Congresso com depoimentos de autoridades de governo passado e atual", observa.

Por fim, o governo monitora o trabalho no Supremo Tribunal Federal (STF), que estuda recurso dos partidos de oposição para forçar a instalação, no Senado, da CPI dos Bingos - pedida tão logo veio à tona o caso Waldomiro. O julgamento foi suspenso quando o placar era de 4 votos a 0 a favor da oposição. A tendência é que o STF determine a instalação da CPI, inerte até agora porque os governistas se recusaram a indicar seus representantes.