Título: Decisões judiciais ameaçam orçamento
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/05/2005, Nacional, p. A7

Os gastos do governo federal com precatórios e pequenas causas judiciais já cresceram 268% desde 2000 e começam a tirar o sono dos técnicos da equipe econômica responsáveis pelo orçamento da União. Só nos quatro primeiros meses deste ano, o governo comprometeu R$ 4,5 bilhões de seu orçamento com as sentenças, e essa despesa deve subir a R$ 14 bilhões até o final do ano, de acordo com estimativas mais atualizadas. A maior parte desse rombo se deve ao esqueleto do INSS decorrente de uma decisão da Justiça sobre o cálculo das aposentadorias no início do Plano Real, mas o novo fantasma que atormenta a área orçamentária são as pressões para cumprir decisões judiciais que beneficiam os próprios servidores públicos. Até abril, o governo já gastou R$ 2,1 bilhões dos R$ 3,6 bilhões reservados para essa rubrica no orçamento. No novo relatório de programação orçamentária divulgado nesta semana, o governo já aponta acréscimo de R$ 670 milhões na despesa de pessoal com sentenças proferidas no 2.º semestre de 2004. E o passivo a ser pago pode crescer ainda mais nos próximos meses, tal a velocidade com que os tribunais vêm julgando as chamadas causas de "pequeno valor", limitadas a R$ 15 mil por pessoa.

"Isso ganhou uma velocidade imensa. Tem advogados orientando as categorias a entrarem com centenas de pequenas ações individuais, em vez de uma ação coletiva, para se beneficiarem da agilidade dos juizados especiais", afirma o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo.

Até 2000, a despesa de pessoal decorrente de sentenças judiciais não passava de R$ 1,3 bilhão. Desde então, esse tipo de gasto tem crescido a uma média de 30% ao ano. Só no âmbito das universidades federais, por exemplo, o governo teve de desembolsar R$ 1,2 bilhão ano passado por ações vencidas pelos servidores e professores. No caso dos esqueletos da Previdência, a previsão do Orçamento é destinar aos aposentados uma cifra de R$ 9,3 bilhões neste ano.

Para o economista Raul Velloso, especialista em finanças públicas, o governo federal deve enfrentar a "bola de neve" dos precatórios de duas formas: primeiro, melhorando a gestão e tomando mais atenção para evitar novos passivos judiciais; segundo, recorrendo a negociação para tentar escalonar o pagamento das sentenças.

Uma opção, diz Velloso, seria reconhecer esses esqueletos como dívida e buscar uma forma de financiá-las, como fazem os governos estaduais com o Supremo Tribunal Federal (STF). Os Estados buscam fórmula de transformar precatórios em títulos negociáveis no mercado financeiro e garantir a credores recebimento imediato em troca de desconto.

Na semana passada, o ministro Nelson Jobim chegou a conversar sobre o tema com o novo secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Murilo Portugal, mas a União não cogita fazer o mesmo, porque a medida provocaria elevação da dívida pública, apesar de aliviar o fluxo de caixa.

"As decisões judiciais, em alguns casos, são fator de risco adicional para o equilíbrio das contas públicas", admite o secretário do Tesouro, Joaquim Levy. Mas ele não considera comparável a situação da União com a de Estados, onde a falta de capacidade de pagar tem levado governadores a descumprirem ordens judiciais.