Título: Setor contesta Dilma sobre custos de Angra 3
Autor: Nicola Pamplona
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/05/2005, Nacional, p. A8

Avaliação é que ministério superdimensionou valor de construção a usina para garantir recursos a hidrelétricas

RIO - O setor nuclear brasileiro começa a se mobilizar para garantir uma vitória na disputa pela conclusão de Angra 3, projeto parado há duas décadas, que já tem US$ 750 milhões em equipamentos comprados. Esta semana, a Associação Brasileira para o Desenvolvimento das Atividades Técnicas e Industriais na Área Nuclear (Abdan) concluiu um estudo sobre o custo da energia gerada pela nova usina, feito em parceria com a consultoria Excelência Energética, para contestar dados apresentados pelo Ministério de Minas e Energia (MME) em seu parecer sobre a questão. A avaliação é que o MME, que votou contra a usina, superdimensionou os custos de sua construção. Na avaliação de especialistas do setor, o ministério quer garantir às hidrelétricas os escassos recursos para financiamento ao setor elétrico. O estudo da Abdan garante que é possível gerar energia em Angra 3 a, no máximo, R$ 140,91 por megawatt/hora (MW/h), cerca de R$ 40 a menos do que o valor constante no relatório do MME. Segundo a associação, o ministério considerou que a usina será construída em 8,5 anos, enquanto a Eletronuclear teria condições de fazê-lo em 6,5 anos.

Além disso, o MME teria reduzido a 8 anos o custo de amortização do empréstimo necessário para financiar a obra, que poderia ser pago em 12 anos, segundo a consultoria. O custo do capital próprio utilizado pela Eletronuclear, estimado em 12% pelo ministério também foi distorcido, diz o presidente da Abdan, Ronaldo Fabrício. Segundo ele, é possível realizar a obra a um custo de capital de 7,2%. Estimativas apontam para um custo adicional de US$ 1,8 bilhão para terminar as obras - 60% gastos em compras no Brasil.

A estatal responsável pela usina gasta, por ano, US$ 20 milhões (cerca de R$ 50 milhões) apenas com a manutenção dos equipamentos, estocados no complexo nuclear de Angra e na Nuclep, fábrica de equipamentos pesados em Sepetiba, região metropolitana do Rio. Sua conclusão foi discutida na última reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), com a votação empatada em 2 a 2, antes de a Casa Civil suspender a reunião - MME e Ministério do Meio Ambiente votaram contra. Ciência e Tecnologia e Casa Civil, a favor.

TRANSFERÊNCIA DE SABER

Especialistas em energia nuclear argumentam que a construção de Angra 3 é fundamental para a transferência do conhecimento brasileiro na área. "Todos os técnicos que tocaram o antigo programa nuclear estão se aposentando e não há novos profissionais para receber este conhecimento", lamenta Ronaldo Fabrício, para quem a conclusão da usina também incentivaria a formação de novos técnicos.

Estados Unidos e China, por exemplo, têm planos agressivos de construção de novas usinas, para enfrentar a escalada do custo mundial da energia. Para o presidente da Abdan, o Brasil terá que seguir este caminho, mais cedo ou mais tarde. "Aí, já teremos perdido todo o conhecimento na área."