Título: Um caminhão, 3 toras e muitas dúvidas
Autor: Alcinéa Cavalcante, Cristina Amorim e Zequinha Net
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/05/2005, Vida &, p. A10

Foi o resultado de uma operação do Ibama para verificar a ação de madeireiros ilegais

ÓBIDOS - A operação começou com grandes promessas, mas terminou com um caminhão quebrado e dúvidas sobre o que fazer com a madeira apreendida. Foi no ínicio da semana, em Óbidos, município a 780 quilômetros de Belém, no Pará. A equipe de técnicos do Ibama, que partiu da cidade vizinha de Oriximiná, foi deslocada com dois policiais militares para verificar a ação de madeireiros ilegais armados em um quilombo na região. O grupo demonstrou apreensão, na noite anterior, de que houvesse pistoleiros escondidos na mata e, portanto, preferiram esperar pela chegada de reforço policial que viria de Santarém.

A mudança de prioridades beneficiou o prefeito local, que havia recebido denúncias sobre a retirada de árvores de terras em seu nome, localizadas na zona rural de Óbidos. A equipe chegou ao local, acompanhada pelo carro da reportagem do Estado, pouco antes de 9 horas. No caminho de terra estava um caminhão velho, com três toras de itaúba (Mezilaurus sp.), árvore resistente muito visada pela indústria de navios.

Mesmo sem medir, os técnicos calculavam que havia mais de uma árvore cortada na boléia. Além da itaúba, são bastante visadas na região a maçaranduba (Manilkara sp) e o pau d¿arco ou ipê amarelo (Tabebuia seratifolia).

O veículo não conseguia passar pela estrada de terra, em condições precárias pela falta de conservação e o excesso de chuvas. Mesmo assim, a equipe do Ibama insistiu para que o motorista, Janari Viana Machado, levasse o caminhão com as toras embarcadas para a cidade.

Depois de permanecer com o motor ligado por mais de dez minutos, enquanto os técnicos manobravam o próprio carro para abrir espaço na estrada, o caminhão parou de funcionar. É a bateria, disse Machado. "Ele fez de propósito", comentavam os técnicos entre si, enquanto se perguntavam como levar a madeira para a cidade e onde ela seria armazenada.

Machado, de bermuda, sem camisa e de chinelos, esperava pela decisão do Ibama sentado no chão. "Sei que não podia tirar a árvore, mas foi um pedido do meu irmão", disse. "Não pode tirar mais madeira nenhuma!" Nenhum dos técnicos seguiu até o local onde ocorreu a extração para conferir se aquelas toras eram realmente as únicas retiradas, como defendia Machado, ou apenas parte de um lote maior, como diziam os moradores de uma comunidade local que assistiam à ação.

Passou-se quase uma hora de deliberações. A equipe do Ibama resolveu apreender todo o material do motorista e de seu acompanhante. Os dois seriam encaminhados à delegacia, onde ficariam retidos até que a madeira pudesse chegar à cidade. O carro da reportagem - que já havia sido cedido para tentar movimentar o caminhão - foi usado para levar os acusados e o material para a cidade.

À tarde, a prefeitura tentava encontrar um trator que pudesse remover caminhão e toras da estrada de terra. Todas as demais ações programadas pela equipe para a região - inclusive a ida ao quilombo - foram adiadas.