Título: Fraudadores amargam prejuízo
Autor: Leonencio Nossa
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/05/2005, Metrópole, p. C5

Pedir empréstimo no banco, dar o carro zero quilômetro ou usar o dinheiro da poupança foram formas encontradas por pessoas da classe média de Brasília para pagar uma quadrilha especializada em garantir aprovações em concursos públicos. Catorze funcionários do Tribunal de Justiça do Distrito Federal contaram ontem à Polícia Civil ter pago até R$ 40 mil pelo emprego no serviço público, com salários de R$ 2.200, no caso de técnicos, e R$ 5.800, oficiais de Justiça. O concurso, realizado em 2003, não é a única seleção que está sendo investigada. Há indícios de que os fraudadores atuaram em 12 concursos nos últimos seis anos em diversos Estados. "Os beneficiários do esquema em Brasília eram estudantes de classe média recrutados em cursinhos ou por uma rede de informações", disse o chefe da Polícia Civil do DF, Laerte Rodrigues de Bessa. "Os fraudadores só apresentavam a proposta quando tinham certeza de que o candidato manteria a idoneidade na relação criminosa." A quadrilha - que contava com oficiais das polícias Civil e Militar, professores e um funcionário do Centro de Seleção e Promoção de Eventos (Cespe), da Universidade de Brasília - repassava com antecedência gabaritos de provas ou incluía nomes dos candidatos nas listas de aprovados, segundo o delegado Celso Ferro, que investiga o caso.

Um candidato pagou uma quantia a Hélio Ortiz, acusado de ser o chefe do esquema, ao ser informado três dias antes do concurso do tema da redação. Ele, no entanto, teve mau desempenho e foi reprovado. Ortiz não aceitou devolver o dinheiro. "Fiz minha parte, não tenho culpa se você é burro", disse, segundo diálogo registrado pela polícia.

Um técnico judiciário do Tribunal de Justiça que está preso contou em depoimento que repassou para Ortiz um Gol modelo 2003 quando passou no concurso. O técnico não tinha dinheiro para pagar a ação dos fraudadores. O técnico informou ter recebido, por telefone, parte do gabarito dias antes do exame e outra parte momentos antes de fazer a prova.

PRISÕES

Ontem, a polícia de Mato Grosso prendeu mais duas pessoas envolvidas no escândalo dos concursos públicos. Dos 104 mandados de prisão, 80 já foram cumpridos. A polícia esperava prender na noite de ontem Hélio Ortiz. A polícia tem indícios de fraudes nas seleções do Tribunal de Justiça do Pará, do TRE de Tocantins e da Secretaria de Fazenda de Mato Grosso.

O esquema foi revelado no domingo, durante realização do concurso para agente penitenciário do Ministério da Justiça. O reitor da UnB, Lauro Morhy, teria uma conversa à noite com o delegado Laerte Bessa. Morhy evita comentar o caso. Já a diretora do Cespe, Romilda Macarini, avaliou que as informações divulgadas pela polícia ainda são muito "vagas". Ela nega envolvimento de funcionários do Cespe no esquema de fraude.