Título: Governo faz jogo bruto e libera R$ 700 milhões para evitar CPI
Autor: Christiane Samarco e Cida Fontes
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/05/2005, Nacional, p. A4

O Congresso fará hoje a leitura formal do pedido de criação da CPI dos Correios, em meio a uma operação desesperada do Palácio do Planalto para reverter o apoio dos dissidentes da base aliada e evitar a abertura da investigação parlamentar. A ofensiva incluiu a ameaça de demissão de apadrinhados dos aliados que mantiveram o apoio à CPI e a liberação de R$ 700 milhões para bancar as emendas dos congressistas ao Orçamento da União, transferindo recursos para obras em suas bases eleitorais. A tensão política atingiu seu grau máximo ontem, com ameaças do presidente do PTB, deputado Roberto Jefferson (RJ), de "arrastar o governo e o PT" para o foco do escândalo da corrupção nos Correios. Nervosos, os ministros José Dirceu, da Casa Civil, e Aldo Rebelo, da Coordenação Política, puseram de lado a disputa pessoal que travam há meses e uniram-se para acalmar o petebista na tentativa de desmontar a CPI.

A dupla conseguiu o recuo de Jefferson, que chegou à reunião da cúpula do partido no meio da tarde, revelando-se disposto a retirar sua assinatura do requerimento de apoio à CPI. Para tanto, esperava ser inocentado pelo ex-chefe do Departamento de Contratação dos Correios Maurício Marinho, que já havia prometido poupá-lo no depoimento à Polícia Federal. No início da noite, o PTB anunciou oficialmente que retiraria as assinaturas do pedido de CPI - num gesto que o Planalto espera ver seguido pelos demais partidos da base, inclusive o PT. Àquela altura, a avaliação era de que o governo tinha avançado muito no desmonte da CPI.

"Eu não retiro minha assinatura, mas a pressão é tamanha que meu prognóstico, agora, é o de que a CPI não sai", disse o deputado Walter Pinheiro (BA), da esquerda do PT. "O jogo está bruto", afirmou o líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ). Depois do recuo dos 13 petebistas, a contabilidade mais otimista do governo registrava a possibilidade de uma baixa de 10 das 19 assinaturas de petistas, de outra dezena entre os 16 pepistas e de até 20 dos 33 peemedebistas.

Dois líderes aliados ao Planalto advertiram, porém, que Aldo e Dirceu terão de trabalhar muito hoje para reverter a folga de votos da oposição no placar da CPI. Até a noite de ontem, o requerimento contava com o apoio de 258 deputados e 51 senadores - enquanto o mínino necessário para criar uma comissão de inquérito são 171 deputados e 27 senadores. Diante dessa contabilidade, o governo terá de correr contra o relógio, pois o prazo do Planalto encerra-se à meia-noite de hoje, quando as assinaturas serão encaminhados para publicação pelo Diário do Congresso.

Para os dois líderes governistas, o sucesso de uma operação política dessa natureza depende da ação efetiva de todo o governo. Em outras palavras, todos os ministros políticos deveriam montar um quartel-general no Congresso para ajudar o Planalto a desmontar a CPI. O problema é que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva viajou para a Coréia levando em sua comitiva os ministros do Turismo, Walfrido Mares Guia (PTB), e da Agricultura, Roberto Rodrigues (sem partido, mas com influência sobre a bancada ruralista). Pior: nenhum dos 19 ministros do PT participou da reunião convocada pelo próprio Dirceu, na noite de segunda-feira, para organizar a ofensiva no Congresso.

Um dos ministros presentes ao encontro palaciano contou que o clima da conversa foi de pessimismo. "Está tudo muito ruim", confessou Dirceu, que não poupou críticas ao PT. Segundo seus colegas de ministério, o petista tem consciência de que seu partido está "ajudando a fazer toda essa confusão no Congresso".