Título: Para Jobim, reforma sai ainda este ano
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/05/2005, Nacional, p. A10

O presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, mostrou-se animado sobre as chances de aprovação da reforma do Judiciário em vários contatos que teve com executivos de negócios, advogados, acadêmicos e juízes na visita de três dias a Washington, encerrada ontem com almoço na Suprema Corte, no qual ele foi homenageado pela presença de quatro dos nove juízes do tribunal máximo dos EUA - Sandra Day O'Connor, Anthony Kennedy, David Souter e Stephen Breyer. Em todos seus encontros, Jobim enfatizou a recente criação do Conselho Nacional de Justiça como passo importante para a modernização do sistema e disse que o projeto em tramitação no Congresso, contendo várias reformas processual para reduzir o congestionamento dos tribunais e tornar a Justiça brasileira mais ágil, tem boas chances de ser aprovada ainda este ano, a despeito das dificuldades crescentes de se formarem coalizões no Congresso e da resistência dos que se beneficiam do status quo.

"A reforma do Judiciário deixou de ser assunto de juízes, promotores e advogados e passou a ser uma demanda da sociedade", disse o ministro. "A pressão da sociedade faz com que hoje haja massa crítica no Congresso para que a reforma seja aprovada."

O papel de Jobim na defesa da reforma do Judiciário e os avanços alcançados foram aplaudidos por Peter J. Messitte, juiz federal de Maryland e ex-voluntário do Corpo da Paz em São Paulo, nos anos 60, que manteve vínculos com o Brasil e é hoje o elo entre os judiciários dos dois países. "Para os envolvidos com atividades de promoção do primado da lei em várias parte do mundo, as recentes medidas de reforma do Judiciário no Brasil são extraordinariamente significativas", disse Messitte ao Estado. Segundo o juiz, que ofereceu a Jobim com uma placa comemorativa à sua viagem a Washington, em jantar na embaixada do Brasil, na segunda-feira, "a emenda constitucional que criou o CNJ e a súmula vinculante para certas decisões do STF representam importantes passos em tornar a Justiça mais acessível e menos cara para o público brasileiro".

Outras reações, no entanto, foram mais reservadas. Representantes de bancos e de indústria que dependem de proteção de propriedade industrial mostraram-se pouco convencidos com as respostas que ouviram de Jobim, que se concentraram mais no diagnóstico dos problemas. A razões do ceticismo foram refletidas num acabrunhante artigo publicado ontem na última página do primeiro caderno do Financial Times sobre os efeitos nocivos da disfuncionalidade do sistema judicial brasileiro sobre a economia. Sob o título "O pesadelo judicial do Brasil trava o crescimento", a matéria focaliza triste saga do engenheiro civil Álvaro Pinheiro, de 67 anos, credor de R$ 2,7 milhões do governo do Estado de São Paulo por serviços prestados que tenta receber na Justiça há oito anos. Com sua firma à beira do colapso e suas finanças pessoais arruinadas, ele provavelmente não verá a cor do dinheiro embora tenha ganhado em todas as instância judiciais, incluindo o Supremo. "Pinheiro é apenas um na multidão de vítimas do disfuncional sistema judicial do Brasil, que é visto cada vez mais como um obstáculo ao desenvolvimento", informou o FT. Depois de explicar que o sistema favorece a inadimplência e força os bancos a oferecer empréstimos "a taxas astronômicas pois eles não tem como executar débitos", o jornal londrino afirma que o efeito "mais preocupante" da paralisia do sistema judiciário brasileiro "é que projetos vitais de infra-estrutura estão parados porque os investidores não têm garantias de que o Judiciário fará valer seus direitos".

Feita aparentemente para coincidir com a visita de Jobim aos EUA, a reportagem do FT, produzida por seu correspondente em São Paulo, Jonathan Wheatley, traz foto do presidente do supremo e uma declaração na qual ele manifesta-se "cautelosamente otimista" sobre a reforma do sistema.

Professor de direito constitucional, constituinte de 1988 e ex-ministro da Justiça no governo de Fernando Henrique Cardoso, Jobim em Washington previu que a aprovação das reformas pedentes deverá ser seguida por iniciativas para favorecer uma maior especialização dos juízes em áreas novas do direito ligadas ao progresso tecnológico como a propriedade intelectual, energia e telecomunições. "Não se trata de criar tribunais especializados nesses temas, mas de aumentar o grau de conhecimento dos juízes nos vários tópicos e estruturar as turmas de juízes federais de forma a que limite a possibilidade de um mesmo caso gerar opiniões judiciais diferentes, como ocorre hoje", disse.

Político originário do PMDB gaucho, Jobim é citado como um possível nome para compor, como vice, a chapa da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à reeleição, no ano que vem, numa aliança PT-PMDB.

O ministro, que viaja acompanhado por sua mulher, Adriene Jobim, uma advogada e ex-alta funcionária da Fazenda na área do combate a crimes financeiros e lavagem de dinheiro, terá compromissos hoje em Nova York antes de regressar a Brasília, depois dos feriados de Corpus Christi.