Título: Acordo abre caminho para aprovação de juízes
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/05/2005, Internacional, p. A14

Um acordo de última hora negociado por 14 senadores centristas dos partidos Democrata e Republicano evitou ontem uma confrontação constitucional em torno do regimento interno do Senado sobre o processo de confirmação de novos juízes federais. A minoria democrata havia advertido que a ativação da "opção nuclear" pelos republicanos - usando uma questão de ordem para fazer, por maioria simples, uma mudança regimental que normalmente exige dois terços dos senadores - paralisaria o Congresso e envenenaria de vez o tóxico ambiente político que já se respira há alguns anos em Washington. O compromisso permitiu que alguns juízes conservadores nomeados pelo presidente George W. Bush, cuja confirmação os democratas vinham obstruindo havia vários anos, sejam finalmente considerados em voto do plenário. Em troca, os republicanos prometeram preservar a norma regimental que exige maioria qualificada de 60% para quebrar a manobra de obstrução parlamentar conhecida como "filibuster", encerrar o debate e submeter a matéria em pauta à votação. Usado ao longo das décadas pelo partido que está na minoria, pelos mais diversos motivos, o filibuster é uma das tradições que diferencia o Senado da Câmara de Representantes, onde todas as decisões são tomadas por maioria simples.

Ciosos das regras do jogo, vários senadores do partido conservador disseram nas últimas semanas que não seria prudente mudar o regime da casa porque ele será útil quando os republicanos forem minoria.

Como resultado do acordo, os senadores aprovaram ontem por 81 votos a 18 uma moção para encerrar o debate sobre a nomeação da ultraconservadora Priscilla Owen, juíza da Suprema Corte estadual do Texas, cuja indicação por Bush para um dos tribunais federais de apelação estava travada havia mais de quatro anos. Dois outros dos dez juízes sobre os quais os democratas levantaram sérias objeções, na maior parte dos casos por posições favoráveis à criminalização do aborto, também foram beneficiados: Janice Rogers Brown e William Pryor.

Embora o compromisso bipartidário não tenha sido celebrado como um triunfo pela oposição - "eu hesitaria em dizer que foi uma vitória para o Partido Democrata", disse seu presidente, Howard Dean - e Bush se tenha dado por satisfeito, porta-vozes da ultradireita religiosa e seus aliados no Congresso vestiram a carapuça da derrota. O pastor James Dobson, presidente da organização Foco na Família, disse que o acordo foi um recuo inaceitável "e uma traição por um conluio de republicanos".

"De um modo geral, isso é um grande desapontamento, em questão de princípio", afirmou o senador George Allen, republicano da Virgínia e pretendente potencial à sucessão de Bush, nas eleições de 2008. "Este acordo desaponta todos aqueles que, entre nós, acreditam no princípio de que todas as pessoas deveriam ter o direito de ver seu nome submetido a uma votação." Allen observou que "todos deveriam ver claramente que nada foi resolvido em relação às vagas que inevitavelmente surgirão na Suprema Corte", chamando atenção para a questão que motivou os republicanos ultraconservadores a agir: o desejo de desimpedir o caminho e assegurar-se de que não terão de enfrentar filibusters democrata quando for aberta uma ou mais das nove vagas de juiz da Suprema Corte. O líder da maioria republicana, Bill Frist, que também é aspirante à Casa Branca e defensor do uso da "opção nuclear", saiu politicamente desgastado do episódio.