Título: Só obra não evita cheia, diz Arce
Autor: Mauro Mug
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/05/2005, Metrópole, p. C3

O secretário estadual de Energia e Recursos Hídricos, Mauro Arce, admitiu ontem que a conclusão das obras de aprofundamento da calha do Rio Tietê não evitará o transbordamento e as enchentes nas Marginais durante chuvas mais intensas, como a de terça-feira. Mais que isso, disse que mesmo as maiores intervenções têm alcance limitado. "Em dez anos, o Tietê chegará ao limite. Não há mais espaço para obras de contenção das cheias", afirmou. "Está tudo ocupado por uma expansão imobiliária que impermeabilizou o solo, fazendo as águas das chuvas chegarem em maior volume e velocidade ao rio." "Toda vez que a vazão for superior a 1.048 metros cúbicos por segundo, o Tietê inundará em alguns pontos", explicou Arce. Isso porque o projeto da obra foi calculado com base em dados das enchentes dos dias 1.º e 2 de fevereiro de 1983. Concluiu-se que o limite máximo era de 1.048 m3/s. "Na época, o Tietê transbordava com uma vazão de 600 m3/s", disse o secretário. "Com as chuvas do início da semana, o rio enfrentou vazões de 1.230 m3/s."

Qual seria a solução? "A construção de mais piscinões", argumentou, com ressalvas: "Eles resolvem problemas locais e amenizam os da bacia hidrográfica. Mas os espaços também estão acabando." Hoje, há 14 piscinões na Bacia do Tamanduateí e 5 na do Pirajuçara. Outros 5 estão em licitação e 27 na fase de projeto.

Arce deu um exemplo das limitações dos piscinões. Acima da Barragem da Penha, na região do Parque Ecológico do Tietê, existe uma área de várzea inundável que absorve a chuva com a mesma capacidade de 400 reservatórios. "No passado, era assim em toda a extensão do rio, mas, ao longo dos anos, o trecho entre a Barragem da Penha e o Cebolão foi ocupado sem controle."

Para os especialistas, esse é justamente o ponto. As obras precisam ser acompanhadas de outras medidas, como políticas que evitem que o solo da região metropolitana fique ainda mais impermeabilizado, fazendo a água da chuva ir diretamente aos rios sem ser absorvida ao longo do caminho.

O presidente da Agência da Bacia do Alto Tietê, Julio Cerqueira Cesar Neto, explicou que o aprofundamento da calha e os piscinões são importantes, mas dependem de outras políticas. "O problema crítico é a expansão da mancha urbana. O crescimento sempre foi e segue desordenado."

Para o professor Aldo Rebouças, da Universidade de São Paulo (USP), as obras são "meros paliativos" se não forem feitas campanhas de conscientização. "A população precisa saber usar melhor o solo e jogar lixo onde se deve. Caso contrário, o poder público vai continuar correndo atrás do problema e não haverá jeito."

Na opinião do ambientalista Carlos Bocuhy, integrante do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), o rebaixamento da calha do Tietê em 2,5 metros transformou o rio no maior piscinão do mundo. "Há um rebaixamento do terreno de apenas 10 a 15 centímetros a cada quilômetro percorrido. Com o aprofundamento da calha, o rio enche e não escoa rapidamente", disse. "Com as chuvas de terça, as obras se mostraram insuficientes para conter as cheias."

"Como acontece com a seleção na Copa do Mundo, quando aparecerem milhares de 'técnicos' para dar palpite, após inundações surgem muitos 'engenheiros hidráulicos' para dizer o que está errado", ironizou Arce. "Realmente, a declividade varia de 10 a 15 centímetros por quilômetro. Mas se não tivéssemos rebaixado a calha, as enchentes teriam sido muito piores."

Bocuhy e o secretário concordam num ponto: faltam políticas mais eficazes contra a impermeabilização. Arce defende a substituição de áreas cimentadas por quintais gramados, além de construção de calçadas e estacionamentos vazados, para permitir a absorção de água. "É preciso obrigar novas construções a ter mais áreas verdes e controlar o crescimento da cidade, principalmente nas áreas de mananciais."