Título: Ministério reforça lobby por acordo antitabaco
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/05/2005, Vida &, p. A16

O Ministério da Saúde reforça esta semana o lobby no Senado para tentar apressar a aprovação da Convenção-Quadro do Tabaco, documento preparado na Organização Mundial da Saúde (OMS) que traça uma série de estratégias para reduzir o consumo mundial do cigarro. O ministro da Saúde, Humberto Costa, deverá apresentar aos senadores, amanhã, Dia Mundial sem Tabaco, um documento com mais de 10 mil assinaturas pedindo a aprovação do documento e também o apoio de um fundo, cuja criação será enviada ao Congresso em forma de projeto de lei, para financiar culturas alternativas ao fumo. Os contornos finais do projeto já foram definidos pelo Ministério da Saúde e agora devem ser submetidos ao crivo dos Ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Agrário e da Fazenda. Os recursos obtidos pela taxação, que incide sobre a venda de cigarros, seriam revertidos para financiar culturas alternativas. Se a criação do fundo vingar, um dos principais argumentos contrários à aprovação da Convenção-Quadro do Tabaco seria neutralizado.

A indústria do cigarro e produtores sustentam que a convenção traria enormes prejuízos às famílias que se dedicam ao plantio do fumo. "Este argumento econômico é malicioso. Estudos mostram que esta ameaça aos produtores não existe", afirma a chefe da Divisão de Controle do Tabagismo no Instituto Nacional de Câncer (Inca), Tânia Cavalcante. "A demora na aprovação é uma vergonha para o País. Deixa claro no cenário internacional que o Brasil é refém da indústria do cigarro."

A própria OMS sustenta que os efeitos econômicos na agricultura do tabaco seriam sentidos somente entre netos dos atuais produtores. "Os argumentos, que já eram frágeis, ficam agora insustentáveis com a proposta da criação deste fundo", afirma Tânia. Além da criação do fundo, integrantes do ministério vão intensificar as visitas a senadores para demonstrar a necessidade de aprovação.

A pressa não é à toa. O Brasil tem de depositar na ONU a ratificação da convenção-quadro até 7 de novembro. Só assim terá direito a participar da primeira reunião das partes, marcada para fevereiro. Somente países que ratificaram a convenção têm direito a participar do encontro.

O evento é considerado fundamental, pois é o momento em que as regras de funcionamento da convenção são definidas e as possíveis formas de auxílio aos países participantes são discutidas. "A ausência do País neste encontro seria um vexame. Mas mais do que isso. Um desperdício de oportunidade para já começar a delinear possíveis formas de ajuda para substituição das nossas culturas de fumo", avalia Tânia.

O Brasil é o segundo maior produtor de fumo do mundo. Perde apenas para China. Cerca de 95% da produção nacional está concentrada no Sul. Somente no Rio Grande do Sul, cerca de 150 mil famílias têm seu sustento ligado à produção nestas lavouras. "Com recursos do fundo brasileiro e do internacional, haveria condições de sobra para que as famílias substituíssem suas lavouras sem que nenhum prejuízo fosse registrado." Tânia cita ainda o caso da Índia, terceiro produtor mundial de tabaco, que ratificou a convenção em fevereiro de 2004 e, mesmo assim, conseguiu aumentar em 14% suas exportações no período 2004/2005.