Título: Viagra: FDA estuda casos de cegueira
Autor: Simone Iwasso
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/05/2005, Vida&, p. A17

O Food and Drug Administration (FDA), órgão americano que regula a liberação de medicamentos, anunciou ontem que vai estudar uma possível relação entre casos raros de cegueira e o consumo de remédios para disfunção erétil, como o Viagra. A própria agência alerta, no entanto, que esse tipo de perda de visão está também relacionada às próprias causas da impotência e o número de casos é ainda muito pequeno para chegar a uma conclusão. As suspeitas estão baseadas em 43 casos de perda de visão de vários graus, incluindo cegueira, entre consumidores das drogas: 38 do Viagra, 4 do Cialis e 1 do Levitra, de acordo com a porta-voz do FDA, Susan Cruzan. "Estamos cientes que pessoas que usavam os remédios sofreram esse tipo de cegueira. No entanto, essa doença acomete o mesmo grupo etário que consome Viagra. Ainda não é possível fazer um relação de causa e efeito", afirmou, destacando que se trata ainda de "um número muito pequeno". Houve também seis casos no Reino Unido, informou sua agência reguladora.

A doença em questão é uma neuropatia ótica isquêmica anterior não-arterítica (naion), que causa súbita perda de visão ao bloquear o fluxo de sangue para o nervo ótico. É uma das causas mais comuns de perda de visão súbita entre os idosos americanos e as estimativas sugerem que a cada ano ocorram de mil a 6 mil casos. Fatores de risco incluem diabete e doenças cardíacas - duas das maiores causas de impotência.

Os casos rotineiros da doença, somado aos fatores de risco que são bastante comuns entre a população, podem impossibilitar que o FDA descubra se os medicamentos realmente aumentam o risco. Porém, por precaução, a agência discute agora com os fabricantes a possibilidade de incluir um alerta de que em casos raros os consumidores desenvolvem cegueira. "Levamos isso a sério", afirmou Susan, Voluntariamente, os fabricantes do Cialis, Eli Lilly&CO e ICOS Corp., já inseriram uma linha de alerta no rótulo do produto.

O fabricante do Viagra, a Pfizer Inc., afirma que 23 milhões de homens em todo o mundo tomaram a droga desde sua aprovação em 1998. O porta-voz da empresa, Daniel Watts, fez questão de ressaltar que não há provas de que o Viagra causou a cegueira. Em nota divulgada ontem, a Pfizer afirma que está discutindo a possibilidade de atualizar o rótulo "com esses raros incidentes oculares".

A hipótese de relação das drogas com a doença foi levantada publicamente no começo do ano pelo médico Howard Pomeranz, da Universidade de Minnesota, que relatou ter atendido sete pacientes que reclamaram de perda de visão após 36 horas de uma dose de Viagra. "Uma relação causal definitiva não pode ser estabelecida no momento", escreveu Pomeranz em uma publicação científica.

Viagra e seus competidores funcionam dilatando levemente as artérias para que o fluxo de sangue no pênis aumente. Se isto afeta o fluxo sanguíneo no olho ainda não se sabe, mas Pomeranz argumentou que a possibilidade de efeitos no nervo ótico é plausível. Por isso, pediu que oftalmologistas perguntassem a pacientes com naion se usavam drogas de impotência e que relatassem os casos.

Apesar da suspeita, urologistas pedem cuidado e esperam por mais estudos para chegar a uma posição. "É ainda uma hipótese, com um número muito pequeno de casos. Fica muito difícil atribuir à droga esse efeito sem fazer um estudo maior, prolongado e sério", afirmou o urologista Douglas Otto Verndl, do Hospital Albert Eintein, em São Paulo. "Não há motivo para pânico. É um número muito insignificante perto da quantidade de pessoas que tomam os remédios."

Para o médico Arnaldo Cividane, chefe do Departamento de Urologia do Hospital Nove de Julho, a associação entre os remédios e a cegueira nunca foi levantada por nenhum estudo. "É uma coisa nova, que nunca vimos acontecer, com todos esses milhares de pacientes que tomam o Viagra há anos. A gente precisa esperar e ficar alerto", disse.

Os medicamentos como Viagra revolucionaram o tratamento de disfunção erétil, transformando-a de um problema pouco discutido em um mercado de cerca de US$ 2 bilhões.