Título: Bilhete pode ter limite: 4 viagens
Autor: Ricardo Brandt
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/05/2005, Cidades, p. C1

A Secretaria Municipal de Transportes anuncia nos próximos dias medidas para coibir fraudes no bilhete único: um esquema que pode desviar até R$ 20 milhões por mês e agrava os problemas do transporte público. Entre as medidas em estudo estão: cadastramento dos passageiros para cassar cartões dos fraudadores; proibição de validar o cartão na catraca; definição de um prazo mínimo, eventualmente de 10 minutos, entre uma viagem e outra e, a mais impopular, limitação de quatro viagens dentro do período de gratuidade (duas horas). Hoje, só têm cadastro os cartões de idosos, estudantes, deficientes e os vales-transporte. Com o cadastramento geral, além de a secretaria poder bloquear os cartões usados irregularmente, será possível chegar a seus donos.

No caso do fim da validação na catraca, só poderá pagar a viagem dentro do ônibus quem não tiver o bilhete único.

Essas e outras ações antifraude elaboradas na secretaria deveriam ser anunciadas hoje pelo secretário de Transportes, Frederico Bussinger, mas o comunicado foi adiado a pedido do prefeito José Serra (PSDB). Ele quer alguns dias a mais para que as medidas sejam estudadas com maior profundidade.

Medida adotada pela ex-prefeita Marta Suplicy (PT), o bilhete único é um cartão magnético que permite ao passageiro pagar uma passagem e, no período de duas horas, utilizar quantos ônibus e microônibus quiser. O sistema teve boa aceitação.

Com um ano de existência, completado no dia 18, o sistema viu o número de passageiros aumentar em 21% na capital. Atualmente, 73,3% das passagens de ônibus são pagas com o cartão.

Foram vendidos desde sua criação 7,8 milhões de cartões, número bem superior à média diária de passageiros que usam o bilhete único - 3,6 milhões, segundo a secretaria. A disparidade numérica evidencia dois problemas: primeiro, a falta de esclarecimento dos passageiros, que se desfazem do bilhete sem recarregá-los; segundo, e mais grave, a utilização fraudulenta dos cartões.

EXCESSO

Levantamento divulgado neste mês pela Secretaria de Transportes mostra que cerca de 650 mil cartões são usados para três ou mais viagens dentro do período de duas horas da gratuidade. Por dia, 90.776 cartões são usados, em média, em até quatro viagens. Já 25.200 cartões são usados em cinco ou mais ônibus dentro de duas horas. E 840 cartões são usados por dia, em média, em oito viagens no período de gratuidade. Por detrás desses dados é que mora o perigo. A Prefeitura desconfia que a maior parte dos cartões com alto número de viagens dentro do período de gratuidade é usada pelos fraudadores. E os especialistas consideram que a maioria dos passageiros faz no máximo quatro viagens.

Pelo menos duas formas de fraude já são conhecidas da secretaria e da maior parte dos passageiros ouvidos pelo Estado.

Um deles é o esquema da "janelinha". Nele, os fraudadores ficam nos terminais ou pontos com o bilhete único e oferecem a passagem com valor reduzido nas filas. A viagem, que custa R$ 2,00, pode valer R$ 1,00. O passageiro sobe no ônibus e passa rapidamente na catraca. O cartão então é devolvido pela janela do ônibus ou da van ao fraudador. O mesmo cartão é "vendido" a outros passageiros que usarão o bilhete dentro de seu período de gratuidade.

Outro esquema conhecido é do "aviãozinho". Ele é parecido com o outro, mas é feito pelos próprios cobradores dos veículos. Eles ficam com bilhetes extras guardados no bolso, além do cartão validador oficial do ônibus ou da van. Quando alguém paga a viagem diretamente na catraca, o cobrador pega o dinheiro para ele e usa os cartões extras que guarda. Esses cartões, em alguns casos, são até trocados entre os cobradores.

"Quando tem pouca gente no ponto, os janelinhas ficam mais na deles. Mas quando isto aqui enche, eles abordam quase todo mundo na fila. Eu, que compro meu cartão certinho, me sinto um otário, pois vejo muita gente pegando ônibus a R$ 1,00", conta o auxiliar técnico Cláudio Buzolin, de 37 anos, que diariamente utiliza uma van e um ônibus para ir de São Mateus, onde mora, até o centro, onde trabalha.