Título: Fonteles vai ao STF para barrar pesquisa com células de embriões
Autor: Mariângela Gallucci
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/05/2005, Vida &, p. A16

O procurador-geral da República, Claudio Fonteles, protocolou ontem no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) contra o artigo da Lei de Biossegurança que permite pesquisas com células-tronco embrionárias congeladas por pelo menos três anos em clínicas de fertilização in vitro. Católico fervoroso, Fonteles argumenta que há vida a partir da fecundação, mas fundamenta a sua ação com depoimentos de nove professores universitários, sem nenhuma menção ao aspecto religioso que envolve a questão. Segundo ele, realizar experiências com embriões desrespeita as garantias constitucionais de inviolabilidade ao direito à vida e de dignidade da ser humano. "O embrião humano é vida humana", afirmou.

O procurador quer que o STF realize audiências públicas com especialistas já ouvidos por ele para provar que as pesquisas com células adultas são mais promissoras do que as com embriões. Um desses especialistas é Lilian Pi¿ero Eça, que em março concedeu entrevista que impressionou Fonteles e o fez refletir sobre a lei.

O procurador envolveu-se recentemente em outra polêmica: a liberação ou não da interrupção da gestação de fetos com anencefalia. Ele é contra o STF autorizar a antecipação dos partos desses bebês. Até o fim do ano o tribunal deverá se posicionar sobre o caso e a expectativa é de que a maioria de seus 11 ministros votará a favor da interrupção dessa gestação.

"A vida humana acontece na, e a partir da, fecundação: o zigoto, gerado pelo encontro dos 23 cromossomos masculinos com os 23 cromossomos femininos", afirmou Fonteles na Adin. Segundo ele, o embrião tem a capacidade de ele próprio formar novos tecidos "constituindo-se em ser humano único e irrepetível".

"EVIDÊNCIA EXPERIMENTAL"

Fonteles acrescentou o argumento de que as pesquisas com células-tronco embrionárias seriam menos promissoras: "A pesquisa com células-tronco adultas é, objetiva e certamente, mais promissora do que a pesquisa com embrionárias, até porque com as primeiras resultados auspiciosos acontecem, do que não se tem registro com as segundas."

Indicado por Fonteles para participar da audiência no STF, o professor Dernival da Silva Brandão, especialista em ginecologia e membro emérito da Academia Fluminense de Medicina, disse que "aceitar que depois da fecundação existe um novo ser humano, independente, não é uma hipótese metafísica, mas uma evidência experimental". Livre-docente pela Universidade de São Paulo (USP), professor de bioética da USP e membro do núcleo interdisciplinar de bioética da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Dalton Luiz de Paula Ramos afirmou que o embrião não é "um simples amontoado de células, é vida humana".

Também citada por Fonteles, a professora Alice Teixeira Ferreira, da Unifesp, ressaltou a existência de textos que confirmam que "o desenvolvimento humano é a expressão do fluxo irreversível de eventos biológicos ao longo do tempo que só pára com a morte". A professora Elizabeth Kipman Cerqueira afirmou que o zigoto "é biologicamente um indivíduo único e irrepetível" e a professora Alice Teixeira Ferreira observou que para usar as células-tronco em pesquisa "é destruído o embrião".

A assessoria do ministro Eduardo Campos informou que, após conhecer os argumentos da Adin, "o Ministério da Ciência e Tecnologia vai avaliá-los junto à comunidade científica e com base nas avaliações construirá um documento a ser encaminhado à Advocacia-Geral da União", responsável pela defesa da União no STF.