Título: Diplomacia de Lula é para inglês ver
Autor: Ana Paula Scinocca
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/06/2005, Nacional, p. A7

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) fez duras críticas ontem à política externa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em palestra na Universidade Cruzeiro do Sul (Unicsul), em São Paulo, FHC disse que o "objetivo do governo atual é uma luta por uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU". Para ele, "esta é a linha fundamental". Em relação ao modelo adotado para com os países pobres, FHC afirmou que se trata "de empenho para inglês ver". As visitas a países como a África e encontros como o realizado recentemente com os países árabes, em Brasília, disse, não têm como objetivo central o incremento das exportações. "Lula vai à África e diz que é para vender mais. Mas não é, até porque não tem quem compre", afirmou. "(As viagens) são para criar simpatia para o Brasil. A mesma coisa com a Liga Árabe. A linha é mais política do que econômica."

Embora tenha reconhecido que as aspirações brasileiras pela vaga no Conselho de Segurança sejam "legítimas", FHC pregou "mudanças mais profundas" no órgão, sob o risco "de sermos ajudantes dos EUA". Também criticou a postura do governo Lula em relação à Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e disse ter "medo" da condução do processo. EUA e Brasil decidiram juntos, na reunião de Miami, mudar a técnica e criaram cardápio. Ocorre, acrescentou FHC, que os EUA têm feito acordos com todo mundo, com a exceção do Brasil. "Vamos competir com os EUA na América Latina", lamentou.

REFORMAS

Durante a palestra, de pouco mais de uma hora, FHC também destacou que dificilmente as reformas tributária, sindical e trabalhista serão aprovadas se mantido o atual sistema político-partidário. Para ele, mais do que uma discussão no Congresso, tais temas deveriam ser discutidos com a sociedade por plebiscitos. "Nosso sistema de representação político-partidária deve ser radicalmente modificado porque permite a permanência na Câmara e no Senado de um conjunto de pessoas que representam posições de um Brasil que já não existe", afirmou.

Sobre tributos, disse que "é impossível fazer reforma tributária sem que ninguém perca. Imposto dá causa a revolução", comentou, citando a Guerra dos Farrapos e a Derrama Mineira. Segundo ele, "briga de imposto é briga de poder e não só do governo, mas da sociedade e de setores que estão se engalfinhando pelo poder."

CPI

Antes da palestra, assistida por cerca de 300 pessoas, o ex-presidente evitou fazer comentários sobre a CPI dos Correios e sobre a queda de avaliação do presidente Lula. "Não quero fazer julgamento apressado. É difícil governar", disse sobre a pesquisa CNT/Sensus.

Em relação à CPI, foi lacônico. "Essa é uma questão do Congresso e dificilmente o Congresso vai deixar de cumprir o que for decidido. Não é problema sobre o qual eu tenha de opinar."