Título: De Norte a Sul do País, agricultores protestam
Autor: José Maria Tomazela e Fabíola Salvador
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/06/2005, Economia, p. B6

O setor agropecuário, única atividade econômica a registrar crescimento nos três primeiros meses do ano (2,6% em relação ao trimestre anterior), viveu ontem um dia de protestos de Norte a Sul do País. O presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Antonio Ernesto de Salvo, disse em Brasília que a agricultura tem problemas diferenciados em cada Região. No Rio Grande do Sul, por exemplo, o problema é a perda de renda por causa da seca, a queda dos preços internacionais e as importações de produtos do Mercosul. Em Mato Grosso, a situação é desfavorável por conta da valorização do real e por causa das dificuldades para escoar a safra. "O dólar do plantio era de R$ 3,20 e o dólar da colheita é de R$ 2,40. É 25% de variação para baixo. Não há lavoura que pague isso."

Segundo De Salvo, a renda obtida com a venda da safra atual não permite pagar as dívidas. Ele reivindicou um mecanismo de refinanciamento que adie para 2006 o pagamento das dívidas que vencem nesta safra.

O presidente disse que a crise no setor agrícola não é generalizada e que segmentos como, leite, café e cana-de-açúcar, passam por um momento favorável. "A agricultura é assim mesmo, num ano está muito boa e no outro, não está."

De Salvo salientou que o setor não pode ser visto como aquele que sempre pede ajuda. "Nosso pleito não pode ser visto como mais uma reclamação de gente que já ganhou muito dinheiro do governo. Essa pode ser uma verdade para alguns, mas não serve para todos os agricultores."

Ele ponderou que espera que o governo ajude o setor, pois "o Brasil não quer matar a galinha dos ovos de ouro". E completou: "Se o fato de o agricultor quebrar não toca o coração do Palocci (ministro da Fazenda, Antonio Palocci), talvez deixar de exportar possa fazer isso."

Em Ourinhos (SP), cerca de 500 produtores rurais, com 180 tratores e máquinas agrícolas, bloquearam o acesso a nove agências bancárias. Os bancos foram obrigados a suspender o atendimento. Parte do comércio baixou as portas. Os veículos foram usados também para interditar as rodovias Raposo Tavares, Orlando Quagliato e a Transbrasiliana.

O protesto causou congestionamentos e princípios de tumulto. Clientes dos bancos que tentavam furar o bloqueio eram barrados. "Isso é palhaçada", reclamou o corretor Elízio Barbosa. O presidente do Sindicato Rural de Ourinhos, Eduardo Bicudo Ferraro, pediu compreensão. "Não temos outro meio para mostrar que a agricultura está desamparada."

O tratoraço começou à 7 horas, com a chegada dos produtores de 11 municípios da região. Segurando faixas que chamavam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de "vampiro da agricultura", eles exibiam um caixão de defunto com soja, milho, arroz, trigo e mandioca. "Se o governo não nos ouvir, não vamos plantar a próxima safra", disse Cristiano Valery, de Ribeirão do Sul. Ele cultiva 80 hectares arrendados e deve cerca de R$ 100 mil, 60% para bancos. Cristiano rodou 38 quilômetros de trator para participar do protesto. Ele acha que o governo devia assentar os arrendatários. "Somos os verdadeiros sem-terra."